Roma: cinco perguntas para
entender o aclamado filme de Alfonso Cuarón
O monumental relato realizado pelo diretor mexicano
passado em seu país nos anos 1970 conquistou em poucas semanas público e
crítica
Roma é,
para muitos, o filme do ano.
O
monumental relato sobre o México dos anos 1970 realizado por Alfonso Cuarón em
seu retorno à direção após ganhar o Oscar de melhor diretor com Gravidade (2013) conquistou público e
crítica ao redor do mundo.
A
história de Cleo, uma empregada doméstica que trabalha para uma família de
classe média no turbulento Distrito Federal do México no início do governo de
Luis Echeverría, ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza e já foi eleita o
melhor longa de 2018 por críticos em Los Angeles, Nova York, Chicago e São
Francisco.
Com
três indicações ao Globo de Ouro, Roma pode fazer
história como o primeiro filme do Netflix a ser indicado às principais
categorias do Oscar.
Inspirado
na infância de Cuarón, o filme é elogiado como uma metáfora do país e de sua
história, de seu passado e de seu presente.
Também
tem sido visto como um relato cru e emotivo sobre as realidades, alegrias,
tristezas e do cotidiano oculto por trás da vida doméstica e um testemunho
desolador - e, ao mesmo tempo, esperançoso - sobre as desigualdades sociais e
raciais não apenas do México, mas de toda a América Latina.
Entenda
a seguir, em cinco perguntas, o filme que estreou no dia 14 no Netflix e está em
cartaz no Rio de Janeiro e em São Paulo até o dia 26 de dezembro.
1 - Por que se chama 'Roma'?
O
título do filme é o nome do bairro onde a trama se desenrola, Colonia Roma, uma
zona em que a classe alta mexicana se estabeleceu na primeira década do século
20 e onde existem até hoje suntuosas mansões e palacetes de inspiração
europeia.
Desde
o terremoto de 1985, a região passou por várias transformações arquitetônicas e
demográficas, ainda que atualmente continue a ser um bairro de classe média e
uma das zonas residenciais mais emblemáticas da cidade.
Mas
o motivo pelo qual o filme se passa ali tem a ver com a intenção do diretor de
recriar sua infância: Cuarón cresceu em uma casa na rua Tepeji, em Roma, que
aparece em uma das cenas do longa.
O
luxuoso bairro serve também como um símbolo para contrastar com as diferenças
sociais de outros ambientes pelos quais passam os personagens, em especial
Cleo, a protagonista.
Diferentemente
de seus patrões, ela e outra amiga, que também trabalha como empregada
doméstica na mesma casa, dormem em um quarto minúsculo, enquanto os namorados
de ambas vivem em um bairro muito pobre e distante dali.
2 - Quem é Libo?
Cuarón
dedica o filme a "Libo", que é como ele e sua família chamam Liboria
Rodríguez, uma mulher de origem indígena que começou a trabalhar com eles
quando o diretor tinha só 9 meses e cuja história de vida serve de base para a
história.
Rodríguez,
que veio da aldeia de Tepelmeme no Estado de Oaxaca, cuidou desde então das
crianças da família de Cuarón, como muitas empregadas domésticas que tiveram um
papel central na vida dos filhos de muitas famílias da América Latina.
Segundo
o diretor, à medida que ele cresceu, se deu conta de que Libo também era uma
pessoa que tinha necessidades, conflitos e uma vida própria, e não era alguém
que só lavava sua roupa ou preparava sua comida.
Foi
nela e em seu papel na família que ele se inspirou para escrever o roteiro, de
cuja cenas os atores só tomavam conhecimento no mesmo dia da filmagem.
3 - Por que se vê tantos aviões no filme?
Em
vez de usar estúdios de filmagens, Cuarón decidiu rodar seu longa em uma casa
em Roma, que foi reconfigurada meticulosamente para que se parecesse com o
local onde cresceu.
Roma
fica próximo de um dos corredores aéreos pelo qual passam centenas de aviões
que cruzam diariamente os céus da Cidade do México para aterrissar em seu
aeroporto internacional, por isso, são uma presença constante no céu do
bairro... e de quase toda a cidade.
Por
isso, os aviões não estão apenas na abertura e no encerremento do longa, mas
seu som permeia todo o desenrolar da trama.
Mas
isso é apenas uma parte da explicação. Há também um fato autobiográfico: Cuarón
era fascinado por aviões e sonhava em ser piloto quando era pequeno (o ator que
interpreta o diretor quando criança conta isso a sua babá).
Além
disso, há uma conotação simbólica. Cuarón contou que as aeronaves cruzando o
céu do México transmitem a ideia de que as situações que os personagens atravessavam
são transitórias e que há um universo que vai além de seus contextos pessoais.
4 - Como o próprio cinema se torna um outro símbolo
do filme?
As
idas ao cinema não são apenas uma válvula de escape de Cleo para suas tarefas
domésticas, mas também para as crianças de que ela cuida.
Roma
utiliza um recurso narrativo conhecido como "metarrelato", ou
"cinema dentro do cinema", em que produções cinematográficas
anteriores são homenageadas pelo autor - inclusive, algumas próprias.
Em
uma das cenas, as crianças vão com a babá ver Sem Rumo no Espaço(1969),
um dos filmes favoritos do diretor quando criança e que lhe serviu de
inspiração para Gravidade.
Há
uma cena de parto similar à que ocorre no filme de Cuarón Filhos da Esperança (2006), e, como em E Sua Mãe Também (2001), dirigido por ele, a mãe
conta aos filhos em um bar ao ar livre próximo da praia que seu pai os
abandonou.
Nos
créditos de Roma, aparece o mantra
"Shantih Shantih Shantih" (Paz, paz, paz), que também aparece
em Filhos da Esperança.
5 - O que foi o massacre de Corpus Christi?
Um
dos elementos que a crítica mais tem aclamado é a cuidadosa recriação de época,
não apenas pelos cenários, vestuários e programas de televisão, mas pela forma
tangencial com que apresenta contextos sociais do México nos anos 1970. Uma das
cenas mais dramáticas mostra a matança de estudantes conhecida como o massacre
de Corpus Christi ou "Halconazo", que ocorreu em 10 de junho de 1971
e que ainda é hoje um dos eventos mais tristes da história do país.
O
incidente começou como um protesto estudantil pela libertação de presos
políticos e por mais investimentos em educação, e terminou como um banho de
sangue quando o governo enviou soldados treinados pela CIA, de um grupo
paramilitar financiado pelo Estado e conhecido como "Los Halcones",
para reprimi-los.
De
acordo com versões de alguns sobreviventes, a princípio, os paramilitares
usaram bastões e varas de bambu empregados na arte marcial japonesa kendo, como
o usado por um dos personagens do filme em seu treinamento, mas, depois, foram
usadas armas de fogo.
O
fato do namorado de Cleo praticar o kendo em um local distante no Estado do
México e se referir aos treinamentos também deixa em aberto uma possível
referência aos grupos paramilitares.
O
massacre de Corpus Christi deixou 120 estudantes mortos, de acordo com
registros oficiais, mas acredita-se que o número de vítimas possa ter sido
ainda maior.
O
acontecimento é retratado de forma hiper-realista no filme em uma das suas
cenas mais comoventes, na qual novamente as desigualdades sociais marcam o
desenrolar da trama.
Fonte:
https://www.terra.com.br/diversao/arte-e-cultura/roma-cinco-perguntas-para-entender-o-aclamado-filme-de-alfonso-cuaron,016f159b6db9ec07fd4cb6c7b0c53a87q8luxdr0.html
19 DEZ 2018 17h56 atualizado
às 18h11
Nenhum comentário:
Postar um comentário