TERROR 2017 56 A NOIVA
Daniel Rodriguez 02/11/2017
Da Rússia, com amor
Boa parte do que
se entende por cinema nos dias de hoje advém de transformações provocadas por
cineastas russos – uns caras tipo Vertov e Eisenstein. Em contrapartida, o
cinema de horror não teve muita expressão entre os sovietes. Pergunto-lhes,
caros leitores, vocês já assistiram algum filme de terror russo? Eu mesmo devo
contar em uma mão os que já vi! Em um caso raríssimo, um longa-metragem oriundo
das terras geladas da mãe-Rússia deu as caras nos nossos cinemas tropicais.
Falo de A Noiva, de Svyatoslav Podgaevskiy. Infelizmente, no meio do caminho, o longa sofreu um atentado na
forma de uma dublagem em inglês. Essa atitude é comum na terra do Tio Sam,
visando aplacar os ânimos dos espectadores que odeiam legendas. No Brasil me
parece um pouco menos justificável, mas é o que temos pra hoje… A trama
incorpora várias lendas, algumas de origem eslava, outras nem tanto. O conceito
básico relaciona-se com aquela velha ideia de que fotografias seriam capazes de
capturar almas. Pois isso é fundido à bizarra tradição de fotografar os mortos
fazendo pose, trazendo uma ideia nova e um tanto quanto complexa.
Aparentemente, ao fotografar um falecido, é possível prender a alma no plano
terrestre, dentro do negativo. O portador deste seria capaz de transportar o
espírito para um novo corpo, prolongando a vida. Dentro dessa ideia, existem
desdobramentos confusos, que parecem oriundos de lendas da região. Mitologias e
estranhezas à parte, A Noiva me parece bem um filme da Blumhouse, só que russo. Seria então
nesse caso, da Blumдом? Não estranharia ler os dizeres “dos produtores de Atividade
Paranormal e Invocação do Mal” em um cartaz. Os tons
escuros, a ambientação e as aparições são bem semelhantes ao que vemos no
cinema mainstream americano
influenciado por James Wan. Temos aqui então um ponto paradoxal, positivo e
negativo ao mesmo tempo. O fato de se assemelhar com um longa da infame produtora
de Jason Blum não traz apenas deméritos. Existe toda uma
construção estética e temática nesses filmes que comunicam muito bem com um
público mais amplo. Podgaevskiy não parece lá muito experiente, mas acerta no
clima que quer construir. Os jumpscares,
por exemplo, não são um problema notável e o roteiro não abraça soluções
faceiras do tipo “especialista em um tema avulso que por coincidência mora no
mesmo prédio”. O visual da mulher que dá nome ao filme também é fruto de um
trabalho bem criativo de design e maquiagem. A grande questão é que
todos esses aspectos tornam-no eficientemente genérico e as alternativas não
são necessariamente boas. Assim como parte considerável das produções da Blumhouse que acerta nesses pontos, fica
um ar de familiaridade que faz com que o conteúdo da fita se misture com todos
os outros trabalhos semelhantes que existem por aí. E acredite, são muitos. E a
resolução da trama é absurda de tão inverossímil, dentro de sua própria lógica
e proposta. A trama remete demais ao sucesso de Jordan Peele, Corra!,
por trazer uma mulher que visita a família do namorado/noivo, apenas para
descobrir que há algo de muito errado por ali. Se o longa de Peele utiliza
desse pano de fundo para falar do racismo, aqui não há nada parecido. Como
mencionado anteriormente, algumas lendas são citadas de forma bem diluída e
esporádica, tendo pouco impacto real. Enquanto assistia ao filme, em uma sessão
quase vazia, uma questão tomava minha mente com frequência. A semelhança com o
mercado americano faz deste um alvo perfeito para um remake. Não
surpreendente, descobri logo depois que a Lionsgate já está planejando a tal
refilmagem, pelas mãos dos escritores de Invocação do Mal… A
Noiva chega suprindo uma demanda constante e crescente de horror do tipo
entretenimento passageiro. Podgaevskiy poderia ter facilmente se aproveitado do
contexto para usar e abusar de lendas locais, tornando seu trabalho único e
interessante, mas contenta-se com o generalismo. A maior decepção permanece por
conta da dublagem em inglês, que tira um dos poucos charmes realmente
diferenciados do longa. Curiosidade: Noiva em russo
é Nevesta, ou невеста em cirílico. Aí está, vivendo e
aprendendo!
2.5 anéis de
noivado para A Noiva
Fonte: http://101horrormovies.com.br/review-2017-56-a-noiva/
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