TERROR 2017 55 THE LIMEHOUSE GOLEM
Daniel Rodriguez 31/10/2017
Antes de Jack,
havia o Golem
Existem lugares
que parecem propensos ao horror e ao mistério. Os becos e vielas sombrios da
Inglaterra vitoriana figuram ostensivamente entre estes, herança clara do
horror gótico que vem povoando nosso inconsciente já faz uma quota, mantendo um
charme que tem resistido sistematicamente ao teste do tempo. Nos últimos
anos, esse gênero literário/cinematográfico tem dado as caras com timidez, por
meio do retorno da Hammer com
seu A Mulher de Preto, da série Penny
Dreadful e até no trabalho de Del Toro em A
Colina Escarlate, entre outras
coisinhas. The Limehouse Golem surge
para compor esse cenário, transbordando de uma vibe totalmente
Jack, O Estripador, porém sem basear-se tanto na realidade, como no caso do
notório assassino em série, um dos primeiros a popularizar essa moda. O
longa ficcional com gostinho de caso real é inspirado no livro Dan
Leno and the Limehouse Golem, de 1994. Obra
esta que acompanha a investigação de uma série de assassinatos brutais e sem
relação aparente, atribuídos a um Golem, em paralelo com o julgamento de
Elizabeth Cree (Olivia Cooke), acusada de envenenar o marido por motivos
torpes. Um dos charmes do livro, transposto para as telas, é a utilização de
personagens históricos reais, como Karl Marx, George Gissing e o próprio Dan
Leno. A adaptação para os cinemas nasce das mãos do diretor Juan Carlos
Medina e da roteirista Jane Goldman e traz um elenco encabeçado por uma
inspiradíssima Olivia Cooke, acompanhada de atores ingleses veteranos e
novatos, como Bill Nighy e Douglas Booth. Ainda não tive o prazer de conferir a
obra literária para saber quais liberdades criativas foram tomadas, tanto na
caracterização desses personagens quanto na própria narrativa diferenciada.
O julgamento de Elizabeth Cree e a caçada ao Golem são o epicentro narrativo do
longa. A partir daí, a narrativa se desdobra em flashbacks, que recontam o passado da mulher e ocasionais cenas em
que a imaginação do detetive Kildare (Bill Nighy) reconstrói as cenas de crime
do monstruoso serial killer pelas ruas do distrito de
Limehouse, sempre com base nos suspeitos. Por muito pouco essa sobreposição de
narrativas não se tornou uma bagunça completa. Felizmente, o resultado é
deveras envolvente. Elizabeth se destaca pela aparência e personalidade
cativantes, capazes de tornar seu destino mais importante que a captura do
assassino. Essa atração ocorre não apenas entre personagem-espectador, mas
também entre a moça e o investigador veterano, para quem ela conta todas as
desventuras de sua infância sofrida e breve carreira artística, prejudicada por
várias razões, mas uma em especial: ser mulher. Ainda mais envolvente
que os flashbacks são momentos horripilantes em que
Kildare interroga os suspeitos do crime e os imagina cometendo as atrocidades
sanguinolentas do Golem, sempre acompanhadas de um narrador com uma voz
distorcida que garante uma dose extra de arrepio. Essa suposta criatura é
de origem judaica e foi representada quase um século atrás, na obra seminal do
expressionismo alemão O Golem,
mas não possui os contornos dados ao assassino do filme. Apesar da mística em
torno do criminoso, a ideia do sobrenatural não é explorada, mantendo os pés no
chão. Ainda mais mítico e antológico que esse monstro é a cena em que vemos
ninguém menos que KARL MARX, aquele mesmo que escreveu O Manifesto Comunista,
decapitando uma pessoa em uma igreja, em uma das visões de Kildare.
Brilhantismo puro! Se o simples conceito de um Karl Marx serial killer não te convenceu a procurar The
Limehouse Golem, talvez a magnífica ambientação na
Londres Vitoriana o faça. Quando não está percorrendo as vielas do bairro
pobre, a ambientação se dá dentro do teatro de Dan Leno, o que remete muito ao Grand Guignol, dito como um dos precursores do
horror. Aparentemente, Leno era famoso pelas performances transvestido, em que
aproveitava-se de uma posição privilegiada para dar voz a problemas enfrentados
pelas mulheres de sua época. No filme ele parece realmente ser um dos poucos
personagens ao lado de Elizabeth. Essa questão do papel da mulher é bem
presente, talvez por termos uma roteirista mulher nos bastidores. É uma
temática que perpassa toda sua duração e tem um grande impacto na conclusão,
tanto no destino de Elizabeth quanto na fantástica reviravolta sobre os
assassinatos do Golem de Limehouse, em todo seu misticismo.
4
facadas para The Limehouse Golem
Fonte: http://101horrormovies.com.br/review-2017-55-the-limehouse-golem/
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