Direção: Ingmar Bergman
Roteiro: Ingmar Bergman
Produção: Lars-Owe
Carlberg
Elenco: Max
von Sydow, Liv Ullman, Gertrud Fridh, Georg Rydeberg, Erland Josephson, Ingrid
Thulin
“Hora do Lobo é o espaço entre a
noite e a madrugada. A hora em que a maioria das pessoas morre, e que a maioria
das pessoas nascem, e que os pesadelos são reais e que a angústia nos
persegue”. Essa é a explicação de Ingmar Bergman, segundo os antigos, sobre o
termo que nomeia seu filme: A Hora do Lobo. E é neste espaço de tempo contínuo permanente
que o diretor irá nos jogar como espectadores de seu labirinto tétrico de
pesadelos. Um filme hermético, difícil de se sintonizar no surrealismo impresso
pelo diretor. A Hora do Lobo é sufocante, estranho, recheado de cenas
bizarras em uma lindíssima fotografia preto e branca sombria, quase
expressionista de Sven Sykvist, onde Bergman desconstrói o maior horror de
todos: a loucura humana. Não há nenhum monstro, nenhum perigo “tangível”. Há
apenas a perturbação da mente, que essa sim, pode criar os piores monstros
imagináveis para si mesmos, capaz de gerar tortura psicológica e o fim do
discernimento do que é real e o que é macabra fantasia. A Hora do Lobo derivou-se
do roteiro de um filme muito mais amplo e abrangente, que se chamaria Os
Antropófagos, abandonado pelo diretor logo após uma crise de pneumonia e a
escolha subsequente de produzir Persona, em 1966. A ideia foi descartada e
compactada para um filme menor. Diferentemente de Persona, onde o inferno
psicológico e o tormento espiritual provém do universo exterior, aqui fica bem
claro que esse tormento parte do interior do artista, dando vida aos seus
pesadelos, saídos das páginas de seu diário. O artista em questão é Johan Borg,
papel de Max Von Sydow (ele mesmo, o padre Merrin de O Exorcista), que se muda
com sua esposa, Alma (Liv Ullmann) para as Ilhas Faroé a fim de um exilo
durante uma temporada, para desenvolver seu trabalho como pintor e artista
plástico. Não precisa dizer que sua vida se transformará a partir desta mudança
e do ponto em que ele se torna insone e seus pesadelos começam a ganhar vida,
principalmente quando confrontada pelos outros bizarros “habitantes” da ilha.
Alma, reprimida, é a personagem que rompe o silêncio de Johan de forma forçada,
impedindo-o até certo ponto de deixar-se cair no mundo melancólico e absorto em
qual vive. Cada frame em que apresenta a convivência entre ambos, parece ser
possível se cortar o ar com uma navalha. Como se não bastasse a opressão que
nos sufoca na dinâmica do convívio entre marido e mulher, uma verdadeira horda
de pessoas estranhas começa a surgir na vida de John, que irá lhe tirar do
eixo. Todas essas pessoas são narradas por Johan à sua esposa e expressas em
seus rascunhos. Entre eles, uma velha que não pode tirar o chapéu, caso
contrário seu rosto cai, os canibais, os homens pássaros, os homens aranhas,
entre outras bizarrices. Momento chave para que as coisas comecem a degringolar
é quando esses personagens começam a aparecer justamente para causar inquietação
e discórdia no casal, que são convidados para um jantar desconcertante no
castelo do Barão Von Merkens. Lá, entre inúmeras conversas fúteis, risadas
exageradas, personagens ácidos e caricatos, sombras e close ups perturbantes,
Bergman faz com que encarnemos em Johan e nos faz sentir nada a vontade,
querendo sair de nossas peles, tal como o personagem em cena. Esse desastre de
reunião social, já com o casal tão pouco a vontade, culmina quando Johan, ali
apenas para fazer o papel de bobo da corte, tem suas inspirações e pretensões
artísticas ironizadas pelos algozes na apresentação em forma de teatro de
bonecos de A Flauta Mágica. Depois dessa sequência, Johan explica à Alma sobre
a tal hora do lobo, e daí para frente é o começo do fim, com duas sequências
extremamente densas e tresloucadas. Primeiro quando o artista está pescando e
mais um dos personagens de seu pesadelo toma vida, uma garota adolescente que o
ataca, mordendo sua pele, querendo se alimentar de Johan, e acaba morto e
jogado no fundo do mar. O segundo, em nova visita ao castelo, Johan está em
busca de sua amante, Veronica Vogler (Ingrid Thulin), quando mais uma vez é
humilhado pelos presentes, colocando-o maquiagem feminina, o que vai torná-lo
motivo de chacota tanto de Vogler quando dos demais ali presentes, que o
observam no escuro dando risadas. Só que Bergman também deixa claro o quanto
nós como espectadores não devemos confiar em Johan quanto narrador, já que os
personagens possuem qualidades sobrenaturais (vide a cena em que a velha tira
seu chapéu e desconstrói seu rosto) e conhecimento da psique e dos pensamentos
do atormentado pintor, revelando-se como projeções da sua imaginação
destrutiva, como a materialização de seus pesadelos. E soma-se isso ao monólogo
final onde Alma tenta atestar a tese de que se você convive muito tempo com uma
pessoa, as duas acabam tornando-se uma só, e fatidicamente, será que uma acaba
vendo o que a outra vê? E o que eles viram? A Hora do Lobo é a obra
prima dos filmes de pesadelo. Exatamente por ele não ser um filme sobre
pesadelos, mas os tem em seu cerne. E os pesadelos, ao ganharem vida,
ultrapassam a natureza do horror pessoal. E é precisamente esse neorrealismo
oblíquo de Bergman que, de forma implícita, nos escancara a concepção desse
pesadelo e nos oferece uma forma de horror sugerido, psicológico, de forma
verbal e visual, nos forçando a testemunhar figuras horríveis e atos proibidos,
que rastejam na mente do personagem e vem para nos assombrar.
FONTE:
http://101horrormovies.com/2013/07/15/214-a-hora-do-lobo-1968/
1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER
489 1968 A Hora do Lobo (Vargtimmen)
1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER
489 1968 A Hora do Lobo (Vargtimmen)
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