sábado, 2 de maio de 2015

#135 1960 OS OLHOS SEM ROSTO (Les yeux sans visage / Eyes Without a Face, França, Itália)


Direção: Georges Franju
Roteiro: Pierre Boileau, Thomas Narcejac, Jean Redon, Claude Sautet (baseado na obra de Jean Redon)
Produção: Jules Borkon
Elenco: Pierre Brasseur, Alida Valli, Juliette Mayniel, Edith Scoob

Os Olhos Sem Rosto de Georges Franju é uma obra-prima. Primeira e única incursão do co-fundador da Cinemateca de Paris no gênero de terror, o filme é de uma beleza grotesca ímpar. Franju explora a mente de um brilhante médico cirurgião psicopata, cheio das boas intenções até a página dois, se recusando à virar o rosto para cenas bizarras e gráficas, aumentando o choque a cada novo elemento explícito colocado em cena, porém sem perder a poesia e o toque francês.Thriller contemporâneo de Psicose A Tortura do Medo, todos os três sofreram ataques devastadores da crítica na época de seu lançamento e ganharam sua devida notoriedade apenas com o passar dos anos e a morte de seus diretores. Isso por esfregar na cara da sociedade na virada dos anos 50 para os anos 60, os monstros de carne e osso que existem dentro da gente, livrando-se da pecha que Hollywood tinha eternizado nas duas décadas anteriores com os monstros da Universal e suas sequências, e os alienígenas atômicos da década recém findada. O monstro aqui no caso é o Dr. Génessier (interpretação fabulosamente contida de Pierre Brasseur), que desfigurou o rosto da filha em um trágico acidente de carro, o qual dirigia em alta velocidade, e amargurado e remoído pela culpa, decide utilizar todos seus dotes para reconstruir seu rosto. Só que para isso, ele precisa de espécimes de tecidos humanos, que consegue com a ajuda de Louise, ex-paciente reabilitada por Génessier, que rapta belas garotas de olhos azuis e faces angelicais, para as terríveis experiências do médico. Os Olhos sem Rosto também funciona muito bem como uma alegoria de crítica e ataque velado ao controle fascista (afinal Génessier é um médico respeitado da sociedade que utiliza de seu poder e influência e sente a necessidade de controlar tudo que acontece a sua volta metodicamente), e ao nazismo (o doutor tem um laboratório secreto escondido no campo, e usa humanos como cobaias para seus fins lunáticos, assim como feito pelos alemães na Segunda Guerra Mundial). Assim como aconteceu em O Testamento do Dr. Mabuse de Fritz Lang, grande amigo de Franju, que recebe sua devida homenagem nesse filme, como a cena de abertura, evocando a sequência final do filme do diretor austríaco. E ainda nessa linha de raciocínio, Franju fez questão de colocar nas suas entrelinhas personagens pobres, de origem não francesas (como uma das moças que foi raptada, que era suíça), que são apenas ferramenta para um afortunado médico, entregues por sua comparsa, como judeus sendo entregues em um campo de concentração, contrastando com a arrogância e a confiança exacerbada da classe dominante em relação aos demais. O que começa com influência do expressionismo alemão e passa pelo cinema noir galgado da literature pulp (já que o filme é uma adaptação da novela policial de Jean Redon), acaba derrapando bonito, para nossa alegria, no realismo brutal e no gore do cinema de horror. Porque o que a gente gosta mesmo é de sangue, bizarrice e deformidades. E Franju não deixa de nos satisfazer, tudo com a mais alta classe, auxiliado pela estonteante fotografia preto e branca de Eugen Schufftan, criador da técnica “Efeito Schufftan”, efeito de trucagem utilizando um espelho metade refletor e metade transmissor colocado na frente da objetiva, utilizada originalmente em Metrópolis (também de Lang). Começa pela incônica máscara sem expressão, à lá Michael Myers, que a filha de Génessier, Christiane (Edith Scob), usa para esconder seu rosto desfigurado, enquanto caminha pelo casarão com sua longa camisola, vivendo seu cárcere privado e vislumbrando o suicídio. Depois somos testemunhas oculares da operação que retira a face de uma das vítimas para ser transplantada em Christiane. A operação, que inicialmente parecia ter sido um sucesso, na verdade começa a se mostrar um desastre com o passar do tempo, conforme a nova pele vai necrosando, tudo mostrado em fotos acompanhada de narração. Isso sem contar o vislumbre do rosto deformado da garota e uma cena de suicídio quando uma das sequestradas se joga da janela e se estatela no chão. 
ALERTA DE SPOLIER (pule para o próximo parágrafo ou leia por sua conta e risco).
Por fim, temos também o ataque dos cachorros que o Dr. Genéssier mantinha em cativeiro para fazer suas experiências antes de testar em humanos, que libertados por Christiane, estraçalham o rosto do doutor. Os Olhos sem Rosto é um dos mais excelentes filmes de terror já feitos. E para quem já assistiu o recente A Pele que Habito de Almodóvar e acha que certas similaridades são uma mera coincidência, não tenha tanta certeza. Vá beber direto da fonte de Franju também.
FONTE: http://101horrormovies.com/2013/04/13/135-os-olhos-sem-rosto-1960/

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