Direção: Kaneto Shindô
Roteiro: Kaneto Shindô
Produção: Hisao Itoya,
Tamotsu Minato, Setsuo Noto
Elenco: Nobuko Otowa,
Jitsuko Yoshimura, Kei Satô, Jükichi Uno, Taiji Tonoyama
Onibaba – A
Mulher Demônio, a obra cultuada de Kaneto Shindô, é um filme de
terror histórico, que baseado em uma parábola budista, escancara o antagonismo
de classes do Japão medieval para criar uma assustadora alegoria sobre a vida
em meio a falta de recursos, segregação social e crítica velada aos efeitos da
bomba atômica. Apesar do ponto de partida do texto budista, não há nenhum
caráter religioso em Onibaba – A Mulher Demônio, e o mal é alguo muito
mais terreno e carnal, o que difere e muito da maioria dos filmes de terror
nipônicos. Recheados de metáforas, bruto, claustrofóbico, de carregada
fotografia preta e branca quase expressionista (crédito para Kiyomi Kuroda),
cenários minimalistas e uma trilha sonora de tambores de Hikaru Hayashi
remetido ao sentimento tribal, a história de Shindô, socialista declarado, é repleta
de metáforas, e mesmo se passando no Japão rural do século XIV, no período
Sengoku, é um filme atemporal, podendo ser anexada a qualquer espaço e tempo. Essa
terrível guerra civil entre clãs samurais pelo controle do Japão durou mais de
um século, e o resultado é um país devastado, sobrando consequências terríveis
para os mais pobres. Uma velha senhora (Nobuko Otowa) vive com sua jovem nora
(Jitsuko Yoshimura) em uma cabana no meio de uma plantação de juncos próximo ao
rio, e para sobreviver, elas matam os samurais perdidos ou moribundos que se
perdem pela extensa plantação e trocam suas armas e armaduras por comida, para
poderem sobreviver em meio ao ambiente desolado. Até que um belo dia, o vizinho
Hachi, que havia ido para a guerra com o filho e marido das duas, volta sozinho
para casa, tendo fugido dos horrores da batalha. O retorno de Hachi e o fato do
filho/ marido das duas estar morto, é o estopim da construção de um
relacionamento entre eles que irá abalar ostatus quo das duas mulheres, e
interferir até diretamente na forma como negociam seus alimentos. Além disso,
uma explosão de desejo sexual entre Hachi e a viúva do amigo unem os dois, sem
qualquer dilema moral ou de consciência, para desgosto da velha senhora, que
tenta em vão assustar a moça com histórias terríveis sobre o inferno, destino
para pecadores que praticam sexo fora do casamento. Isso obviamente não impede
que a moça, independente de horário ou clima, vá até a cabana de Hachi para
consumar o desejo carnal, sem nenhum outro tipo de sentimento envolto. Certa
noite, com a jovem fora, um distinto samurai bate a porta da velha e pede ajuda
para que ela o guie para fora do matagal de juncos, pois havia se perdido ao
voltar da batalha. Esse guerreiro usa uma horrenda máscara de demônio para
cobrir o seu rosto, que segundo ele, é o mais belo rosto que a mulher já teria
visto em vida. Mas mesmo assim, ele não tira a máscara, deixando bem claro a
separação hierárquica entre um samurai e um camponês na base da pirâmide
social. Porém a velha leva o samurai até
uma armadilha, que cai em um buraco e perde sua vida. A obsessão em ver seu
rosto faz com que ela desça até o buraco, onde temos um vislumbre de uma
centena de esqueletos humanos que as duas já haviam matado, e remove a sua
máscara, deparando-se com o choque de uma cena de horror, pois ao contrário do
que havia dito, ele tem o rosto completamente deformado, uma metáfora para
o hibakusha, grupo pária da sociedade e estigmatizado, composto pelas
vítimas dos efeitos da radiação da explosão das bombas de Hiroshima e Nagazaki.
A velha começa a usar então a horrenda máscara para assustar a mais nova pelos
seus pecados. Porém em uma cena terrível, a máscara fica grudada
permanentemente no rosto da mulher, que não consegue tirar de nenhuma forma,
suplicando perdão para a mais nova, que atribuiu o fato a um castigo por ela
tentar assustá-la. Debatendo-se em desespero e implorando por ajuda, a máscara
só consegue ser retirada pela mais nova após alguns golpes de machado, e então
segue-se o clímax da fita.
ALERTA DE SPOILER. Leia por sua conta e risco ou pule para o próximo
parágrafo.
O rosto da velha está igualmente
deformado como do samurai que ela tirou a vida. A jovem foge horrorizada pelos
juncos, perseguida pela velha aos berros, gritando “não sou um demônio, sou um
ser humano” seguido pelo seu final abrupto.A parábola budista a
qual Onibaba – A Mulher Demônio foi inspirada
chama-se yome-odoshi-no-menou niku-zuki-no-men, que conta a história
de uma mãe que costumava usar uma máscara de demônio para assustar sua filha,
impedindo-a de ir ao templo. E como punição, a máscara adere em seu rosto e
quando é removida, leva junto a carne de sua face. Aqui, é um reflexo
traumático dos efeitos do pós-guerra e os horrores que ele desencadeou na
sociedade japonesa.Onibaba – A Mulher Demônio dramatiza o fracasso e expõe
o desejo humano nas mais sombrias manifestações. É amoral, pois em nenhum
momento nos é apresentada a conduta dos protagonistas, tais como assassinato,
posse, controle e desejo sexual, provida de algum sentimento de culpa ou
definindo o que é certo ou errado, apenas relatando homens e mulheres nos
limiares da civilização, vítima de suas condições de vida, dando vazão aos seus
instintos mais básicos e a constante luta por sobreviver, o que pode,
literalmente, despertar demônios.
FONTE: http://101horrormovies.com/2013/06/04/178-onibaba-a-mulher-demonio-1964/
1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER
430 1964 Onibaba: A Mulher Demônio (Onibaba)
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