Direção: Wes Craven
Roteiro: Wes Craven
Produção: Stuart M. Besser, Marianne
Maddalena; Dixie J. Capp (Coprodutor); Peter Foster (Produtor Associado); Wes
Craven, Shep Gordon (Produtores Executivos)
Elenco: Brandon
Quintin Adams, Everett McGill, Wendy Robie, A.J. Langer, Ving Rhames, Sean
Whalen, Bill Cobbs
Todos nós sabemos que Wes Craven mais erra do que
acerta. No caso de As Criaturas Atrás das Paredes, é mais um dos felizes casos em
que ele acertou (tirando aquele finalzinho…). Depois de começar a carreira de
forma brilhante com nada menos que a trinca Aniversário Macabro, Quadrilha de Sádicos e A Hora do Pesadelo, o sujeito dirigiu algumas bombas memoráveis até então, como A Maldição de Samantha e Shocker –
100.000 Volts de Terror. Então parece que As Criaturas Atrás
das Paredes é uma obra de arte perto dos seus últimos filmes. Na verdade
ele é bastante honesto quanto cinema de horror e Craven explora muito bem a
ideia da luta de classes e desigualdade social, e aperta de novo a ferida
contra a elite branca e a desestruturação da família média americana. Fora isso
ele consegue manter boas cenas de suspense e tudo com uma poderosa história por
trás como pano de fundo. Craven é um sujeito que adora tirar ideias de seus
filmes de reportagens de jornal. Foi assim que ele teve o insight sobre a trama de A
Hora do Pesadelo (sobre crianças tailandesas que morriam durante o sono
após ataques de terror noturno) e a mesma coisa neste caso. O diretor,
roteirista AND produtor executivo leu sobre a história real de ladrões que
invadiram uma casa e quando as autoridades chegaram, os meliantes
desapareceram, mas a polícia descobriu portas trancadas com barulho vindo de
seu interior. Crianças eram mantidas ali presas em seus quartos por seus pais,
proibidas de saírem de casa. Sinistro né? Então como a arte curte imitar a
vida, Fool (Bobo) é uma criança negra que mora em um condomínio pobre no gueto
e está preste a ser despejado junto com a irmã (que já tem um filho pequeno) e
sua mãe que está morrendo de câncer e precisa fazer uma caríssima operação (com
dinheiro que obviamente eles não possuem). Leroy (Ving Rhames) então vem com a
ideia de invadirem a casa dos donos do condomínio, que reza a lenda são podres
de ricos e tem moedas de ouro em sua propriedade (que como Silvio Santos bem
ensinou, ouro vale muito mais que dinheiro), e está instalada a fábula de
horror. Acontece que os donos da residência são um esquisito casal, que nunca é
dito seus nomes, e eles se tratam apenas como “Papai” e “Mamãe”, estupendamente
interpretados respectivamente por Everett McGill e Wendy Robie, que também
estupendamente interpretaram outro casal disfuncional na estupenda
série Twin Peaks. O que vamos entender no decorrer do longa é que eles são
irmãos e praticam um relacionamento incestuoso, e possuem uma filha de 12 anos
chamada Alice (A.J. Langer, com 17 anos na época), que vive trancada dentro de
casa sob maus tratos constantes. Só que também descobrimos que algo, ou alguém,
ou alguma coisa, vive no porão do grande casarão e entre as velhas paredes. Fool,
Leroy e mais um vigarista invadem a casa e passam a ser caçados pelo casal e
pelo Rottweiler deles. Para os dois adultos, a coisa não acaba nada bem, então
o garotinho tentando escapar faz amizade com Alice e com uma das “pessoas
embaixo das escadas”, Roach (Sean Whalen, com incríveis 27 anos de idade
interpretando um pivete de 15, 16), diminutivo de cockroach, barata em inglês. Dentro daquele ambiente
claustrofóbico, caçados por dois psicóticos com instintos assassinos,
masoquistas e compaixão zero, se desenvolve toda a perseguição e todos os
momentos de suspense e tensão, principalmente nunca ficando claro quem são
aquelas crianças e adolescentes meio humanoides que vivem atrás da parede.
ALERTA DE
SPOILER. Pule para o próximo parágrafo ou leia por conta e risco.
Fool consegue sair do local maldito com algumas
moedas de ouro, que poderiam pagar o aluguel pelos próximos três anos e o
tratamento de câncer da mãe, e descobre pela história confidenciada pelo seu
avô (Bill Cobbs) que de fato Alice não é filha dos dois irmãos, apenas mais uma
das crianças pobres sequestradas pelos nefastos elitistas e a favor da
higienização social, que ficam mantidos aprisionados. Daí vem a tônica a
revolta de classes e todos os oprimidos moradores da perifa, liderados pelo destemido
Fool com seu dever cívico de voltar ao local e salvar a nova amiga (donzela em
perigo) e junto das crianças resgatadas, se voltam contra os dois
vilões. Até que tudo termina de forma tosca com todo mundo fazendo uma festa
(?!!!) no jardim, depois de Fool mandar tudo pelos ares e tocando um rap
estilão anos 90. Por que, senhor Craven? Parece ser impressionante que As
Criaturas Atrás das Paredes funcione, e poxa, não deveríamos ter esse
sentimento com relação a Wes Craven, uma vez que o cara simplesmente já foi
talvez um dos mais importantes e promissores diretores do cinema de terror.
Aqui ele acerta a mão por conta de se ater ao básico, sem muitas firulas, e
claro, muito pela força dos dois antagonistas, completamente descompassados,
cínicos, psicopatas, incestuosos, praticantes de SM (e o que é o Papai com
aquela roupa de couro preta? Chupa AHS), fundamentalistas religiosos e
canibais, que compensam toda e possível queda para uma desventura infantil,
tipo um Os Goonies às avessas, já que o enredo tem essa pegada
“contos de fadas moderno”. Outro ponto interessante é a exploração da regressão
da humanidade naqueles jovens trancafiados em um porão, que passam a se portar
de forma selvagem e tem até suas feições alteradas, vítimas de maus tratos e
exposição a situações adversas, assim como os moradores da periferia que são
obrigados a recorrer ao crime para poder continuar vivendo com dignidade ou
ajudar os familiares doentes. Invadir uma casa e roubar é errado? Sim, mas Fool
é o herói do filme no final das contas, que salva toda uma comunidade de uma
perversão absoluta em uma construção maniqueísta das mais básicas dos
personagens. Quando Wes Craven acerta, ele acerta de verdade, e As
Criaturas Atrás das Paredes mostra que ele sabe contar a história certa quando
quer (e quanto tem a oportunidade), com muito talento por trás das câmeras, na
direção de atores e sequências de suspense, terror e violência.
Porque quando ele erra…
FONTE: https://101horrormovies.com/2015/02/25/616-as-criaturas-atras-das-paredes-1991/
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