sábado, 14 de maio de 2016

#582 1989 SANTA SANGRE (México, Itália)


Direção: Alejandro Jodorowsky
Roteiro: Alejandro Jodorowsky, Roberto Leoni, Claudio Argento
Produção: Claudio Argento; René Cardona Jr, Angelo Iacono (Produtores Executivos)
Elenco: Axel Jodorowsky, Blanca Guerra, Guy Stockwell, Thelma Tixou, Sabrina Dennison, Adan Jodorowsky, Faviola Elenka Tapia

“Alejando Jodorowsky mostra que o verdadeiro horror físico é possível nas telas. Horror, poesia, surrealismo, dor psicológica e humor perverso, tudo de uma vez só”. Assim o famoso crítico de cinema americano Roger Ebert define Santa Sangre, a obra do diretor chileno, e essa foi uma das poucas vezes que o mala, que já fez até campanha aberta contra o gênero e seus diretores, acertou em cheio tratando-se de filmes de terror. A representação circense do plano onírico e fantástico definida por Jodorowsky e seu cinema nada convencional nos apresenta um verdadeiro desbunde cinematográfico, com direção de arte impecável, figurino estonteante, riquíssimo na caracterização e nos detalhes, que passeia entre o glamour e a decadência, transformando o longa em um impacto visual, uma experiência sensorial tanto para os apreciadores de cinema em geral, quanto para os fãs do gore por meio do absurdo exagero caricato da violência gráfica. Os veteraníssimos do cinema italiano, Claudio Argento (irmão do Dario) e Roberto Leoni tinham em mente a produção de um giallo, daqueles mesmos à moda antiga, envolvendo um assassino que matava mulheres, e ofereceram a direção a Jodorowsky, que saiu de um ostracismo de nove anos desde seu último longa para deturpar completamente qualquer status quo do subgênero, apresentando sua história de vingança, insanidade e psicopatia com toques líricos de um poetismo macabro e virtuoso. Pois bem, a trama foca-se na história de Fênix, contada em flashback e flashforward, que no começo do filme está em estado semi-catatônico em uma instituição psiquiátrica, e logo uma viagem ao passado nos mostrará porque o personagem se encontra nesse estado. O jovem (interpretado pelo filho do diretor, Adan Jodoworosky) é filho de Orgo (Guy Stockwell), líder de uma trupe circense e de Concha (Blanca Guerra), uma contorcionista-trapezista e fanática religiosa, sacerdotisa da herética seita de Santa Sangre, repudiada pela igreja e posta abaixo pela entidade cristã. O moleque já não tem uma infância das mais fáceis, constantemente traumatizado pelas atitudes do pai (incluindo aí tatuar uma fênix em seu peito ainda moleque, para virar “macho” após chorar pela morte de um elefante), até que testemunha o canalha decepando os braços de sua mãe (tal qual a santa que ela venerava) após jogar ácido em suas partes baixas ao pegá-lo transando com a mulher tatuada do circo. Como se não bastasse, o pequeno ainda vê seu pai cortando a própria garganta e se suicidando logo após o acontecido. Corta para o presente novamente, com o Fênix adulto, agora interpretado pelo seu outro filho, Axel Jodorowsky, dando um jeito de dar uma escapada do manicômio, quando após uma noite de folga dos pacientes onde supostamente deveria acontecer uma visita ao cinema, reconhece a mulher tatuada, responsável indireta pelo acontecido com seus pais e ruína de sua própria vida, em uma região de meretrício. O rapaz então começa a botar em prática seu sangrento plano de vingança ao reencontrar a mãe dominante e atuando como os “braços” da progenitora. Além de retomar uma bizarríssima parceria artística com a mãe, Fênix, dominado por ela, ao melhor estilo Norman Bates, descontrola seu ímpeto hardcore assassino, dando um gosto de sangue de vermelho vivo em profusão exagerada e cartunesca na perfeição estética que o diretor vinha imprimindo até então, calcando dali para frente o longa como uma peça ainda mais surreal de humor negro, que obviamente levantará todo tipo de questão sobre a sanidade de Fênix e sobre a própria realidade dos acontecimentos. A marcha fúnebre lúdica que é Santa Sangre (que parece persistir e se abater em todos os personagens depois da fatídica morte do elefante da campanha – e, diga-se de passagem, a cena da procissão e seu desfecho desolador – que evoca a luta de classes – é uma das mais belas da sétima arte) segue sem freio permeando os atos desconexos de Fênix e a convivência nociva com a sua mãe e os demais membros da galeria de figuras excêntricas do circo e da vida cotidiana daquele vilarejo latino americano, acrescentando pastiches de figuras culturalmente icônicas como gaiatos, militares e lutadores de lucha libre mascarados. Santa Sangre é uma peça artística única, que transpira beleza, bizarrice, violência explícita, sexualidade e tragédia. É Jodorowsky saindo por todos os poros, homenageando o cinema de nicho mexicano e o gênero do terror, do clássico ao brutal, tendo ganhado o conceituado Saturn Award, o prêmio de melhor filme no Festival Internacional de Cinema Fantástico de Paris, integrado a seleção oficial de Cannes na categoria Un Certain Regard e presença na lista dos 500 maiores filmes de todos os tempos da revista Empire.
FONTE: https://101horrormovies.com/2014/12/12/582-santa-sangre-1989/

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