Direção: George A. Romero, Dario Argento
Roteiro: George A. Romero, Dario Argento, Franco Ferrini (baseados
na obra de Edgar Allan Poe)
Produção: Achille Manzotti; Dario Argento, Claudio Argento
(Produtores Executivos)
Elenco: Adrienne Barbeau, Ramy Zada,
Bingo O’Malley, E.G. Marshall, Harvey Keitel, Madeleine Potter, John Amos, Tom
Atkins
Romero e Argento juntos dirigindo um filme com contos baseados na obra de
Edgar Allan Poe. “That’s a BINGO!” diria o Col. Hans Landa! Dois Olhos
Satânicos acerta na mão e traz dois dos mestres do
terror em boa forma, abusando de liberdade criativa, mesclando o sobrenatural,
o gótico e o gráfico em ótimos média-metragens. Originalmente, Argento queria
que o filme fosse uma antologia, colaboração entre SÓ os quatro nomes mais f...
do terror naqueles tempos: ele mesmo, George A. Romero, John Carpenter e Wes
Craven, adaptando as importantes e influentes obras do escritor americano. Mas
infelizmente Carpenter e Craven acabaram desistindo do projeto. Mas isso não
abalou o italiano, que tocou a produção ítalo-americana em frente, com Romero
se incumbindo do primeiro segmento, “O Caso do Sr. Valdemar”, e Argento do
segundo, “O Gato Preto”. Seria impossível filmar “O Caso do Sr. Valdemar” em um
média de uma hora de duração, então Romero abusou da livre adaptação e
conseguiu acertar a mão. Ernest Valdemar (Bingo O’Malley) é um velho senhor
ricaço que está nas últimas, sofrendo de uma doença que lhe dá pouco tempo de
vida. Sua esposa, a calculista e gananciosa Jessica (Adrienne Barbeau) então,
com a ajuda do médico, seu amante e especialista em hipnose, o Dr. Robert
Hoffman (Ramy Zada), igualmente calculista e ganancioso, coloca em prática o
plano para ficar com toda a herança milionária de Valdemar. Por meio de hipnose
comandada por Hoffman, o velho assina a papelada e também convence seu
advogado, Steven Pike (E.G. Marshall) de que toda sua fortuna deve ficar para
ela. Tudo está correndo bem e Jessica só precisa que o velho aguente as pontas
por mais três semanas, para que toda a documentação do testamento tenha sido
resolvida. Certa noite, ainda sob o efeito da hipnose, Valdemar acaba
falecendo. Para não perder a bolada, o casal resolve levar seu corpo até o
freezer no porão para que não apodreça, e descobrem que Valdemar está em um
estágio entre a vida e a morte, hipnotizado, com sua mente aprisionada em seu
corpo sem vida, implorando para ser acordado e poder descansar em paz. Acontece
que ao mesmo tempo, nesse plano espiritual límbico, criaturas chamadas por ele
de “outros” estão tentando abrir espaço para nosso mundo, usando a consciência
de Valdemar como porta. Então ao melhor estilo Romero, eis que o velho volta à
vida como um zumbi vingativo, e uma espécie de acerto de contas cármico e
sobrenatural está prestes a acontecer. Parece que além do conto em si, a
inspiração de Romero e a zumbificação de Valdemar também veio da trilogia Muralhas do Pavor, estrelado por Vincent Price e dirigido por Roger Corman durante seu
famoso ciclo de adaptações da obra de Poe para os cinemas.
“O Gato Preto” de Dario Argento, a meu ver, é o melhor trabalho do
italiano desde Suspiria. Em nenhum dos seus vários outros filmes ele
conseguiu atingir um nível tão bom quanto este média. Apesar de não abusar de
vários recursos estéticos comuns em suas obras, como os planos de câmera
elaborados, fotografia, jogo de luzes e a hiperviolência estilizada, Argento
aposta em uma direção mais simples e bruta, sempre permeado pelas influências
do suspense de Hitchcock e o giallo de Bava, e foge dos conceitos rocambolescos
de suas outras produções. Além é claro, de mesclar várias referências da obra
de Poe como easter eggs, prestando um belo de um fan service.
Harvey Keitel (simplesmente incrível) vive Roderick Usher (em alusão ao
conto “A Queda da Casa de Usher”), um fotógrafo policial que se especializou no
mórbido trabalho de fotografar assassinatos brutais. Conhecemos seu ofício
lúgubre ao clicar uma vítima nua partida em duas por um pêndulo afiado (em
alusão a “O Poço e o Pêndulo”). Outro crime captado por suas lentes está uma
mulher que foi exumada para ter todos seus dentes extraídos por seu primo (em
alusão a “Berenice”, em uma ponta de Tom Savini trajado como Poe, uma vez que o
conto é em primeira pessoa e realmente o escritor se casou com sua prima).
Aquele trabalho logicamente ia mexer com qualquer um, mas parece ter um efeito
delicioso para Usher. Certo dia, uma gata preta aparece em sua casa, acolhida
por sua namorada, Annabel (em alusão ao conto “Annabel Lee”), papel de
Madeleine Potter. Logo vemos que um não foi com a cara do outro, e claro que
sabemos que em determinado momento do desenrolar da história, Usher vai matar o
bichano. A partir daí, com o fotógrafo cada vez mergulhando mais em insanidade
e atitudes violentas, e com o sumiço do felino, o seu relacionamento com
Annabel irá degringolar e ele acabará matando a mulher, emparedando-a, tal qual
o conto. Não sei se é SPOILER para você ou não, se já o leu ou
assistiu a algumas de suas muitas adaptações para o cinema, mas a polícia vai
descobrir o corpo por conta dos miados incessantes do gato atrás da parede. A
grande diferença é que Argento é Argento, e um dos momentos mais extremos do
longa é quando descobrimos o corpo da mulher putrefato, devorado por uma
ninhada de gatinhos que foram enterrados junto com a gata grávida. É de
embrulhar o estômago! A grande tropeçada é a extensão da conclusão, que vamos
admitir, foi desnecessária e das mais bestas.
Entre as demais referências neste segmento, há
uma bartender chamada Eleonora e também o vizinho de Usher chama-se
Sr. Pym. Nunca lhe é dito o primeiro nome, mas aposto um picolé de limão que
deva ser Arthur Gordon. Outro grande ponto positivo por trás de Dois Olhos
Satânicos é a presença do veterano Tom Savini cuidando da maquiagem e a
trilha sonora de Pino Donaggio. Mais um nome famoso dos fãs do horror é o de
Luigi Cozzi, diretor de segunda unidade do longa.
Romero e Argento souberam muito bem captar a obra de Poe e transportar
diversos dos principais temas recorrentes em sua escrita em Dois Olhos
Satânicos, que facilmente entra para aquela lista dos melhores exemplares
cinematográficos baseados nos contos de um dos mais prolíficos e inspiradores
nomes da literatura fantástica de todos os tempos.
FONTE: https://101horrormovies.com/2015/01/23/598-dois-olhos-satanicos-1990/
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