quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

JURAMENTO DE VINGANÇA (MAJOR DUNDEE, EUA, 1965)


Direção: Sam Peckinpah
Roteiro: Harry Julian, Oscar Saul e Sam Peckinpah
ELENCO:
Charlton Heston, Richard Harris, James Corburn

Quando os Apaches massacraram a Tropa da Cavalaria americana no Novo México, um Major obstinado oferece a ex-soldados sulistas presos num pequeno Forte de Cavalaria a liberdade, caso sejam voluntários em caçar Apaches que raptaram algumas crianças matando a família. Perseguem combates violentos, com um desfecho sangrento, jamais visto.

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

#102 1957 A NOITE DO DEMÔNIO (Night of the Demon / Curse of the Demon, Reino Unido)


Direção: Jacques Tourneur
Roteiro: Charles Bennett, Hal E. Chester (baseado na obra de Montague R. James)
Produção: Frank Bevis, Hal E. Chester (Produtor Executivo)
Elenco: Dana Andrews, Peggy Cummins, Niall MacGinnis, Maurice Denham, Athene Seyler

A Noite do Demônio é mais um daqueles grandes filmes de terror. Encontra-se enxertado no meio de um monte de bobagens sci-fi que eram feitas durante toda a década de 50, e isso que dá um enorme respaldo para a produção, já que traz um tema que fugia do usual na época e sempre é complexo e assustador: satanismo. Fora isso, temos na direção (mais uma vez brilhante, diga-se de passagem), Jacques Tourneur, que já havia emplacado alguns dos principais filmes de terror feitos até então: Sangue de PanteraA Morta-Viva e O Homem Leopardo. O roteiro do filme, escrito por Charles Bennett, que comprou os direitos do livro Casting the Runes de Montague R. James, foi vendido ao produtor executivo Hal E. Chester, que decidiu levá-lo as telas. Só que Bennet se arrependeu amargamente de ter vendido o texto para Chester, pois logo após o fechamento do negócio, ao chegar à América, foi procurado pela RKO Radio Pictures interessada em produzir o longa e colocá-lo como diretor. Mas a grande verdade é que A Noite de Demônio está envolvido em grandes polêmicas em sua produção, incluindo aí brigas entre o diretor Tourneur e o roteirista Charles Bennett com Hal E. Chester. E se você já assistiu ao filme, sabe exatamente qual deve ter sido o maior motivo da briga entre produtor e diretor. Quem conhece o trabalho genial de Tourneur, sabe muito bem seu apreço pelo suspense e pelo terror psicológico, sempre deixando nas entrelinhas um horror maior do que a exposição explícita, que poderia muito bem, estragar todo o clima do filme. Assim como aconteceu emSangue de Pantera, quando Tourneur quebrou o pau com Val Lewton para não mostrar a tal mulher pantera com seu baixo orçamento e trabalhou o enredo meticulosamente mais com sugestão e apenas um vislumbre final, aqui a treta foi no mesmo nível, para não colocar o demônio gigante com asas, chifre, pés de bode e cara de lobo literalmente em cena, pois sabia do efeito cômico que a coisa poderia obter. E não deu outra. Chester estava decidido a mostrar o demônio para “chocar” e aterrorizar os espectadores, e duas vezes ainda, uma no começo do filme e outra em seu clímax. Tourneur foi contra e não teve parte nas cenas filmadas com a criatura, adicionadas depois na edição. Para ele, o que seria o ideal era a audiência nunca ter a real certeza de ter visto um demônio e manter até essa dúvida nos próprios personagens centrais. Ray Harryhausen, o mestre do stop-motion havia sido requisitado pela Columbia Pictures para criar as cenas com o tinhoso, mas já estava comprometido com os efeitos especiais de outro filme e recusou o trabalho. E aí amigo, deu no que deu. O filme é impecável, até a criatura aparecer, principalmente na tosca sequência final, transformando a cena em um pastiche que só serve para dar risada, com o coisa-ruim amassando o vilão do filme como uma bolinha de papel na estação de trem de Southampton. Segundo o livro Beating the Devil – The Making of Night of the Demon, de Tony Earnshaw, para Chester desde o começo estava claro que o demônio ia sim aparecer em cena, mesmo com todo o protesto de Tourneur, para deixar o público ciente de que os poderes infernais são reais. No mesmo livro, Bennett diz que “se Chester aparecesse no meu caminho nesse momento, eu atiraria para matá-lo”. Bom, vamos à trama. Dr. John Holden (Dana Andrews – muito parecido fisicamente com Lon Chaney Jr.) é um especialista americano em parapsicologia, extremamente cético, que vive para desmascarar e colocar em xeque alguns fenômenos paranormais, principalmente tratando-se de demonologia. Ao viajar para a Inglaterra para ajudar o Prof. Henry Harrington (Maurice Denham) em sua tentativa de desmascarar uma seita satânica chefiada pelo adorador do oculto, Dr. Julian Karswell (Niall MacGinnis), começa a presenciar na pele, mesmo mantendo seu ceticismo, eventos sobrenaturais inexplicáveis. Junto com a sobrinha do Prof. Harrington, Joanna (Peggy Cummins) começa a investigar a estranha morte do companheiro, que morreu eletrocutado em um acidente de carro contra um poste de força, mas que nós sabemos que foi obra do cramunhão, conjurado por Karswell através do uso de runas. Isso por meter demais o bedelho na seita que o vilão comanda, chamada Ordem do Verdadeiro Crente, algo que Holden acaba também fazendo e por isso partilha do mesmo destino, também sendo amaldiçoado por Karswell, que lhe entrega um pergaminho, sem seu conhecimento, fixando uma data e horário para sua morte. Aos poucos, Holden vai se aprofundando nesse ciclo diabólico e estranhos acontecimentos começam a colocar à prova sua crença no sobrenatural, e a única forma de Holden se livrar da maldição e impedir a chegada do demônio para levar sua alma, é entregando esse pergaminho para outra pessoa, transferindo a morte iminente para o próximo. SPOILER ALERT, pule para o próximo parágrafo ou leia por conta e risco: e isso acontece exatamente quando Holden, que já transformou-se em um crédulo nesta altura do campeonato, ludibria Karswell enfiando o pergaminho no bolso do paletó e devolvendo a maldição, fazendo com que o diabão venha tomar sua alma nos trilhos de uma estação de trem, algo que lembra bastante o recente Arraste-me para o Inferno de Sam Raimi, dada suas devidas proporções. Todos os aspectos do roteiro e a criação do clima pertinente de suspense imposto por Tourneur através de sua fotografia preto e branca quase expressionista, ângulos inusitados e a mistura de cortes rápidos para mostrar sempre menos e planos sequências arrasadores, transformam A Noite do Demônio em um filmaço. E vários elementos assustadores estão ali para meter medo nos incautos, como tempestades de vento, farfalhar de árvores e arbustos em um bosque escuro, e até um gato que se transforma em um leopardo em um apartamento. Mas infelizmente o demônio focinhudo, com asas e garras que aparece no final, consegue jogar tudo isso fora e estragar um filme que poderia ser perfeito. Para o lançamento nos EUA, A Noite do Demônio ganhou um corte de oito minutos, para torná-lo mais dinâmico ao publico americano, além de ter seu título alterado para Curse of the Demon. Lançado apenas em meados de 58 nos cinemas yankees, chegou a ser exibido em double features com outro filme inglês, A Vingança de Frankenstein, do famoso estúdio Hammer, com Peter Cushing no elenco.

FONTE: http://101horrormovies.com/2013/03/06/102-a-noite-do-demonio-1957/

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

#163 1963 DRÁCULA, O VAMPIRO DO SEXO (La frusta e il corpo / The Whip and the Body, Itália, França)


Direção: Mario Bava
Roteiro: Ernesto Gastaldi, Ugo Guerra, Luciano Martino
Produção: Frederico Magnaghi, Ferdinando Baldi (Produtor Associado), Elio Scardamaglia (Supervisor de Produção)
Elenco: Daliah Lavi, Christopher Lee, Tony Kendall, Ida Galli, Harriet Medin

Duas constatações permanentes e inegáveis vem à tona ao publicar este post: Primeiro, Mario Bava era um GÊNIO. Segundo, como os títulos de filmes no Brasil são uma piada. Drácula, O Vampiro do Sexo????? Mas que diabos é isso? Obviamente foi uma ridícula solução mercadológica para aproveitar Christopher Lee no elenco. Mas o que tem a ver? A fita não tem absolutamente ligação nenhuma com Drácula e com vampiros. Certo, há um enorme teor sexual por conta da uma personagem safada SM que gosta de levar chicotada. Mas até aí… Na verdade, o lance da chicotada vem sim do título original do filme, La frusta e il corpo, onde a tradução literal seria O Chicote e o Corpo (que também é o título internacional do filme, The Whip and the Body – e como foi relançado em DVD na Coleção Obras-Primas do Terror da Versátil). Para pirorar, há também um título alternativo aqui no Brasil de O Vampiro e o Sexo. Quase a mesma palhaçada. Importante é que isso não desmereça essa obra prima e muito menos, afaste-o dela, caro leitor. A opulência visual, o esmero de Mario Bava no uso das cores e da iluminação para criar uma atmosfera gótica de terror é inigualável. Toda sua preocupação com a obtenção do clima perfeito, auxiliada pela fotografia (aqui crédito para Ubaldo Tezano com um dedo de Bava), a ambientação de época, a trilha sonora de Carlo Rustichelli (com seu piano chorando desde os créditos de abertura), e os ângulos e movimentos de câmera utilizados pelo maestro do macabro, fazem de Drácula, O Vampiro do Sexo(argh!!! Odeio escrever este título) um dos melhores filmes do diretor italiano. A trama sobrenatural, com requintes de luxúria e paixão gótica, traz um Christopher Lee simplesmente incrível. Amoral, sinistro, arrogante, sua simples presença na tela e suas poucas falas (mesmo que dubladas) são o suficientes para colocar o personagem Kurt Menliff no hall da fama dos melhores vilões que Lee representou em sua gigantesca carreira. Maligno, ele é um filho pródigo que retorna à residência dos Menliff com o intuito falso de parabenizar seu irmão, Christian (Tony Kendall) pelo casamento com a bela Nevenka (interpretada pela palestina Daliah Lavi) e pedir perdão ao seu pai. Na verdade, Kurt havia sido escorraçado da família, e o motivo que todos nutrem esse ódio por ele, é por conta de ter tido um caso com uma das criadas do castelo, que a levou ao suicídio. Por conta da infâmia, Kurt se afastou, foi deserdado pelo seu pai, o Conde Menliff e deixou na mãe da moça, Gioriga, aquele gostinho amargo de vingança na boca (a mulher guarda até hoje o punhal que a filha usou para se matar, guardado dentro de uma redoma de vidro), assim como sua outra filha, Katia.
Só que como todo bom filme de Bava, o que importa mesmo está nas entrelinhas, e a trama vai mais uma vez escancarar algo corriqueiro na obra do diretor: a decadência da instituição familiar. Relações bizarras entre todos os membros da família Menliff e a criadagem saltam aos olhos. Casamentos de interesses, paixões arrebatadoras não consumadas, adultério, mesquinharia, e claro, relacionamentos sadomasoquistas bizarros (ainda vou chegar lá). Novamente, os títulos de Conde e o dinheiro, que talvez fosse abundante outrora, levam os Menliff a um espiral de desgraça e baixeza, o que se completa na figura escrota de Kurt, que pode tanto ser produto do meio quanto vice-versa, representando toda a degeneração daquela casa. Pois bem, o filme deixa o espectador boquiaberto quando em um idílico passeio de cavalo pela encosta, Nevenka é abordada por Kurt, e aí descobrimos então o caso dos dois e a paixão não consumada. Vale lembrar aqui que Nevenka está preste a se casar com o irmão de Kurt, Michael, casório imposto pelo enfermo Conde Menliff, sendo que na real, Michael gosta mesmo é da empregada Katia (os Menliff tinham uma queda pelas serviçais do seu castelo, pelo jeito). Pronto, estabelecido o dramalhão mexicano, é hora da violência e do medo entrarem em cena. Kurt começa a relembrar dos bons e velhos tempos, e diz em uma das frases mais emblemáticas do longa (quiça da carreira do ator): “Você não mudou. Você sempre adorou violência”, e tome chicotada na garota, que ao mesmo tempo que se contorce de dor, se contorce de prazer com seu êxtase fetichista. E isso meu amigo, estamos falando do ano de 1963. Claro que Bava seria tachado de um velhinho pervertido e o filme, criado especialmente para tentar faturar alguma grana no mercado internacional (vide todos os realizadores com seus nomes americanizados. Até Bava dirigiu a fita sob o pseudônimo de John M. Old), seria brutalmente mutilado pela censura, com todas as cenas de violência sadomasoquista (que aconteceriam de novo mais algumas vezes até seu término), chegando a ficar inteligível. A versão uncut do diretor só foi lançada, de forma restaurada, muitos anos mais tarde, graças aos esforços de Tim Lucas e Joe Dante.
FONTE: http://101horrormovies.com/2013/05/15/163-dracula-o-vampiro-do-sexo-1963/


117 1938 A MULHER DO PADEIRO (LA FEMME DU BOULANGER, França)


Direção: Marcel Pagnol
Produção: Leon Bourrely, Charles Pons
Roteiro: Marcel Pagnol, baseado no livro A mulher do padeiro, de Jean Giono
Fotografia: Georges Benoît
Musica: Vincent Scotto
Elenco:
Raimu, Ginette Leclerc, Robert Vattier, Robert Bassac, Fernand Charpin, Edouard Delmont, Charles Blavette, Marcel Maupi, Maximilienne, Alida Rouffe, Odette Roger, Charles Moulin, Yvette Fournier, Charblay, Julien Maffre

Orson Wells considerava Raimu um dos maiores atores de sua época e A mulher do padeiro mostra que ele tinha razão. Dirigido por Marcel Pagnol e baseado em um romance de Jean Giono, o filme conta a história de Almable Castanier, um padeiro de meia-idade (Raimu) em um pequeno vilarejo na Provença. Quando sua jovem mulher Aurèlie (Ginette Leclere) o abandona por um belo pastor, o atormentado padeiro desiste de fazer pães e, sem eles, o vilarejo para. Um padre católico, um professor esquerdista, um senhor de terras e todos os habitantes do vilarejo deixam de lado suas antigas rixas e se juntam para trazer de volta a esposa desgarrada. A vida volta ao normal e todos ficam felizes. A partir de um material tão simples, Pagnol criou uma pérola cômica e uma obra prima humanista. Com seu habitual grupo de atores - Raimu, Fernand Charpin, Robert Vattier e outros - , Pagnol dá vida a uma galáxia de personagens que é ao mesmo tempo engraçada e comovente. Seu toque leve e o talento dos atores transcendem os estéreotipos grosseiros (o aristocrata mulherengo, o professor pedante, a velha rabugenta, o marido chifrudo), criando um mundo em que o papel de cada personagem é definido com clareza. A Provença de Giono e Pagnol é conservadora e patriarcal (a esposa não tem multa voz), mas é um mundo no qual valores fundamentais compartilhados por todos - aqui representados pelo pão, um símbolo tanto para o cristianismo quanto para o paganismo - cimentam a coesão social. A atuação majestosa de Raimu alterna, sem esforço aparente, teatralidade cômica e realismo minimalista, transformando seu cômico marido traído em um herói trágico. Raimu, ele mesmo do Sul da França, era um ator de teatro sublime, muito à vontade com os floreios de linguagem e a impostação inflamada do vernáculo marselhês. Sua modernidade cinematográfica, no entanto, está na habilidade de mudar, numa questão de segundos, para um tom mais brando em determinados momentos, causando um impacto emocional extraordinário, conforme ilustrado pela cena mais famosa do filme. Quando a esposa arrependida retorna, Raimu a recebe de volta como se nada tivesse acontecido, porém desabafa com a gata vira-lata, "Pomponnette", usando as palavras mais intensas e comoventes. Nesse momento de alta comédia, desafio qualquer pessoa a não chorar. O título pode ser A mulher do padeiro, mas o filme é, sem dúvida, de Raimu. GV

(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 117)

036 1927 NAPOLEÃO (NAPOLÉON, França/Itália /Alemanha/Espanha/Suécia/Checoslováquia)


Direção: Abel Gance
Produção: Robert A. Harris
Roteiro: Abel Gance
Fotografia: Jules Krueger,
Joseph-Louls Mundwiller, Torpkoff
Música: Arthur Honegger
Elenco:
Antonin Artaud ………Marat
Albert Dieudonné …...Napoleão Bonaparte
Vladimir Roudenko …Napoleão Bonaparte criança
Edmond Van Daële …Maximilien Robespierre
Alexandre Koubitzky ..Danton
Abel Gance …………..Louis Saint-Just
Ainda: Abel Cance, Gina Manes, Suzanne Bianchetti, Marguerite Cance, Yvette Dieudonné, Philippe Hériat, Pierre Batcheff, Eugénie Buffet, Acho Chakatouny, Nicolas Koline

Contendo 222 minutos na sua versão mais longa, a cinebiografia de 1927 de Abel Gance é um épico de escalas que satisfariam seu protagonista. Embora acompanhe Bonaparte desde seu tempo de estudante em 1780 - comandando guerras de bolas de neve - até a triunfante campanha italiana de 1796, para os padrões contemporâneos o filme carece de profundidade. Para Gance, Napoleão (interpretado por Albert Dieudonné, que faz jus ao nome) era um "homem guiado pelo destino", não pela psicologia. Sua veneração ao imperador francês tem algo em comum com Alexandre Nevski (1938), de Sergei Eisensteln, sendo ambos empolgantes exemplos de cinema a serviço da propaganda nacionalista. Se Gance é mais um inovador do que um artista, o fato de Napoleão ainda transbordar energia e inventividade até hoje serve de medida para o seu brilhantismo. Nenhum de seus contemporâneos - nem mesmo Murnau – usou a câmera de forma tão inspirada. Gance não via problemas em amarrar cinegrafistas a cavalos; chegou até a montar uma câmera numa guilhotina. Em outra sequência brilhante, ele captura o espírito revolucionário de uma vibrante (e muda) execução da "Marselhesa" fazendo a câmera balançar sobre o cenário como se estivesse em um trapézio. Seu mais espetacular engenho, no entanto, é a "Polivisão", um efeito de tela dividida que necessitava de três projetores para criar um tríptico - quase três décadas antes do advento do Cinerama. TCh
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 036)

190 1946 OS ASSASSINOS (THE KILLERS, EUA)


Direção: Robert Siodmak
Produção: Mark Hellinger
Roteiro: Anthony Veiller, baseado no conto de Ernest Hemingway
Fotografia: Elwood Bredell
Música: Miklós Rózsa
Elenco:
Burt Lancaster, Ava Gaidner, Edmond O'Brien, Albert Dekker, Sam Levene, Vince Barnett, Virginia Christine, Jack Lambert, Charles D. Brown, Donald MacBride, Charles McGraw, William Conrad, John Huston

Indicação ao Oscar: Robert Slodmak (diretor), Anthony Veiller (roteiro), Arthur Hilton (edição), Miklós Rózsa (música)

Os primeiros 10 minutos do filme noir clássico de Robert Siodmak reproduzem o conto de 1927 de Hemingway quase literalmente: dois assassinos invadem uma vila adormecida para matar o recluso Swede (Burt Lancaster), que não oferece resistência. Abusando da imaginação, os roteiristas Anthony Velller e John Huston inventam Riordan (Edmond O'Brien), um dedicado investigador da companhia de seguros, que desvenda o passado de Swede: um ex-pugilista que se envolveu com uma mulher de reputação duvidosa (Ava Gardner), um roubo e uma traição. Cidadão Kane fragmentou sua narrativa em flashbacks relatados por diferentes narradores: Os assassinos leva a Ideia um passo além ao misturar a ordem cronológica dos flashbacks. O processo de montagem desse quebra-cabeça reforça a ligação recíproca entre o espectador e Riordan. À medida que mergulha no passado de Swede, o infatigável Riordan sente a emoção de vivet através do outro uma vida de filme noir sem sofrer as consequências. A relação entre ele e o mundo ilícito de Swede se torna análoga àquela do espectador com o filme – um conceito que é cristalizado quando, logo antes do embate final, a silhueta de Riordan senta-se em primeiro plano como se estivesse na primeira fileira de um cinema. Os assassinos é não só um excelente filme noir, mas também uma reflexão sobre por que gostamos do gênero, que nos oferece uma escapatória da segurança monótona, levando-nos em direção ao perigo e à perdição, mas a uma distância segura. MR
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 190)

188 1946 A BELA E A FERA (LA BELLE ET LA BÊTE, FRANÇA)


Direção: Jean Cocteau
Produção: André Paulvé
Roteiro: Jean Cocteau, Jeanne-Marie Leprince de Beaumont
Fotografia: Henri Alekan
Música: Georges Auric
Elenco: Jean Marals, Josette Day, Mlla Parély, Nene Germon, Michel Auclair, Raoul Marco, Marcel André

Jean Cocteau nunca se intitulou um cineasta, per se. Ele se considerava um poeta; o cinema era apenas uma das muitas formas de arte que abraçou no decorrer de sua carreira. No entanto, mesmo que Cocteau se visse como um poeta em vez de um "mero" cineasta, sua versão brilhante e visionária desta história folclórica clássica certamente provou que os dois títulos não se excluíam mutuamente. Além disso, o fato que, de todos os seus projetos, o onírico A bela e a fera continue sendo sua obra mais adorada revela não apenas sua imensa versatilidade e talento como também a perenidade e aceitação em massa do cinema acima de todos os seus formatos de preferência. De fato, Cocteau abordou A bela e a fera - apenas seu segundo longa-metragem - com plena consciência do alcance da mídia e impulsionado por uma série de compromissos. Por um lado, seus colegas esperavam que ele colocasse o cinema francês de volta no mapa depois do atraso cultural maciço causado pela ocupação alemã; o filme deveria ser, na prática, uma afirmação nacional dos propósitos da comunidade artística francesa. Por outro, Cocteau também estava sendo rechaçado pelos críticos, que o ai usavam de elitismo artístico e de estar fora de contato com os gostos do público. Poderia ele produzir uma obra comercial que fosse bem recebida pelas massas? Com esses dois desafios em mente, Cocteau abordou a fábula centenária de" A Bela e a Fera" como uma válvula de escape para seus impulsos criativos mais exóticos e fantásticos. Na verdade, a estrutura relativamente direta da história original encorajava esse tipo de experimentação. Quando seu pai é aprisionado por uma Fera aparentemente monstruosa (Jean Marais) em um castelo remoto, a filha, a Bela (Josette Day), se oferece para ficar no seu lugar. Porém a barganha da Fera é mais do que parece: ele diz à Bela que pretende desposá-la. Porém ela precisa ver além das aparências e descobrir o bom coração do seu pretendente peludo antes de tomar sua decisão. Cocteau instaura essa corte em um castelo mágico - que se prova cenário para uma série de belos efeitos. A Bela não se limita a andar pelos corredores; ela desliza por eles. Velas não são sustentadas por candelabros tradicionais, mas agarradas por braços afixados às paredes. Espelhos são transformados em portais líquidos, chamas queimam e se extinguem por vontade própria e estátuas ganham vida. O castelo serve tanto como metáfora para a personificação do processo criativo quanto como desculpa para várias imagens freudianas. Uma vez que a Bela não pode exatamente consumar seu relacionamento com a Fera antes de ele se transformar, Cocteau a faz acariciar facas e descer longos corredores para revelar seus desejos subconscientes. Entretanto, a maior façanha de Cocteau foi tornar a Fera monstruosa ao mesmo tempo convincente e cativante. Com Marais enterrado debaixo de uma maquiagem complexa, a bondade da Fera precisa ser transmitida através de atos e gestos, revelando assim a humanidade que jaz literal e figurativamente sob a pelagem e as presas. Na verdade, a representação de Marais é tão bem-sucedida que, na estreia do filme, quando a Fera finalmente se transforma no singelo Príncipe e ele e a Bela vivem felizes para sempre, a atriz Creta Garbo exclamou sua famosa frase: "Quero minha fera de volta!" JKl
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 188)

185 1946 O DESTINO BATE A SUA PORTA (THE POSTMAN ALWAYS RINGS TWICE, EUA)


Direção: Tay Garnett
Produção: Carey Wilson
Roteiro: Harry Ruskln, baseado no livro de James M. Cain
Fotografia: Sidney Wagner
Música: George Bassman
Elenco:
Lana Turner ………Cora Smith
John Garfield ……..Frank Chambers
Cecil Kellaway ……Nick Smith
Hume Cronyn …….Arthur Keats
Leon Ames ………..Kyle Sackett
Audrey Totter ……..Madge Gorland
Ainda: Alan Reed. Jell York

Lana Turner jamais esteve tão atraente como no papel de Cora Smith, que se casa com um homem mais velho insosso (Cecil Kellaway) para escapar da pobreza, mas que, profundamente insatisfeita, sucumbe à sua atração por Frank Chambers (John Garfield), um jovem andarilho. Como muitos filmes noir, o relacionamento do casal malfadado depende de um crime, o assassinato do marido de Cora. Com a ajuda de um advogado inescrupuloso, a dupla é inocentada. No entanto, eles não conseguem encontrar a felicidade, pois Cora é morta em um acidente de carro e Frank é executado por este "crime". Os enquadramentos claustrofóbicos de Tay Garnett enfatizam o aprisionamento dos amantes mortais e a mise-en-scène melancólica e proibitiva do filme é o cenário perfeito para sua trama sinistra. Com seu figurino branco e glamourizada pela iluminação, Turner se torna o centro visual da história, baseada no romance de James M. Cain publicado na década anterior. Cora não é uma femme fatale comum. Seus sentimentos por Frank são verdadeiros, e não uma manipulação ardilosa. O destino bote à sua porta reflete a cultura da Depressão de 1930, com muitas de suas cenas se passando em um restaurante de beira de estrada que mantém sua respeitabilidade por um fio, um símbolo pungente de desenraizamento e falta de oportunidades. A narrativa em flashback combina com o pessimismo onipresente dos filmes noir, dos quais este é, com justiça, um dos mais célebres exemplos. RBP
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 185)


domingo, 28 de dezembro de 2014

184 1946 PAISÁ (PAISÀ, ITÁLIA)


Direção: Roberto Rossellini
Produção: Mario Conti, Rod E. Geiger, Roberto Rossellini
Roteiro: Alfred Hayes, Federico Fellini, Sergio Amidei, Marcello Pagliero, Roberto Rossellini
Fotografia: Otello Martelli
Música: Renzo Rossellini
Elenco:
Carmela Sazio ………….. Carmela
Robert Van Loon ………… Joe, Soldado Americano
Benjamin Emanuel ……….. Soldado Americano
Raymond Campbell ……….. Soldado Americano
Harold Wagner ………….. Harry, Soldado Alemão
Albert Heinze ………….. Soldado Alemão
Ainda: Merlin Berth, Dots Johnson. Alfonsino Pasca, Maria Michi, Gar Moore, Harriet Medin, Renzo Avanzo, William Tubbs, Dale Edmonds, Cigolani, Allen Dan

Indicação ao Oscar: Alfred Hayes, Federico Fellini, Sergio Amidei, Marcello Pagliero, Roberto Rossellini (roteiro)

Qualquer um que vá assistir a Paísá sem saber do seu status como obra-prima do neorealismo pode ser perdoado por desistir logo no começo: imagens de arquivo da campanha americana na Itália, música ao estilo hollywoodiano, maus atores vociferando ordens militares. É apenas no final do primeiro dos seis episódios independentes que o estilo improvisado de Roberto Rossellini começa a operar sua mágica dura: logo depois que uma bala mata abruptamente um soldado que está contando sua história de vida, vemos o cadáver do seu companheiro, morto pelos alemães e desprezado pelos americanos sobreviventes que o tomam por um "carcamano sujo". A crônica de 1943-46 de Rossellini é marcada pela devastação, brutalidade e incompreensão em todos os níveis. Um americano não percebe que uma prostituta é a muIher que ele amou seis meses atrás; um menino de rua fica amigo de um soldado negro alcoólatra e rouba seus sapatos assim que ele cai no sono; a imagem final do filme – inesquecivelmente desoladora - mostra a execução impiedosa de uma fileira de guerrilheiros. Rossellini desenvolve uma estrutura à altura dessa sucessão de acontecimentos, baseando-se em elipses surpreendentes na trama, diálogos conflitantes em diversas línguas e uma apresentação dos horrores rigorosamente não-sentimental. Paisá localiza narrativas pessoais dentro do pesadelo histórico da guerra. AM
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 184)

sábado, 27 de dezembro de 2014

BREAKING BAD 1ª TEMPORADA ()EUA, 2008)


BREAKING BAD 1ª TEMPORADA ()EUA, 2008)


183 1946 DESENCANTO (BRIEF ENCOUNTER, INGLATERRA)


Direção: David Lean
Produção: Noel Coward, Anthony Havelock-Allan, Ronald Neame
Roteiro: Anthony Havelock-Allan, David Lean, Ronald Neame, baseado na peça Still Life, de Noel Coward
Fotografia: Robert Krasker
Musica não original: Rachmaninoff
Elenco:
Celia Johnson ………….. Laura Jesson
Trevor Howard ………….. Dr. Alec Harvey
Stanley Holloway ……….. Albert Godby
Joyce Carey ……………. Myrtle Bagot
Cyril Raymond ………….. Fred Jesson
Everley Gregg ………….. Dolly Messiter
Ainda: Marjorie Mars

Indicação ao Oscar: David Lean (diretor), Anthony Havelock-Allan, David Lean, Ronald Neame (roteiro), Celia Johnson (atriz)

Festival de Cannes: David Lean (Palma de Ouro)

Os épicos imponentes da maturidade de David Lean às vezes ameaçam ofuscar os relativamente modestos primeiros trabalhos do diretor. Porém concentrar-se demais no puro espetáculo de Lawrence da Arábia e Doutor Jivago significaria ignorar algumas das maiores façanhas de Lean. Afinal, apenas um cineasta de primeira grandeza poderia dirigir Lawrence da Arábia, e este mesmo domínio da forma está patente nos seus filmes anteriores, embora em escala muito menor. Lean já havia dirigido três adaptações da obra de Noel Coward quando iniciou Desencanto, baseado na peça de um ato do autor chamada Still Life. Contudo, a brevidade da peça o forçou a expandir o material e, durante o processo, ele ampliou também seu próprio vocabulário cinematográfico. Contado em flashback, Desencanto acompanha o caso amoroso platônico entre a dona-de-casa Laura (Celia Johnson) e o médico Alec (Trevor Howard). que se conhecem por acaso em uma estação de trem. Há obviamente uma conexão entre os dois, porém ambos sabem que o romance não pode ir além de alguns almoços furtivos. Ao elaborar um dos mais eficazes arranca-lágrimas da história do cinema, Lean realizou uma série de avanços formais que lhe deram rapidamente a reputação de mais do que um mero seguidor de Noel Coward. Para começar, ele retirou a história da estação de trem, acrescentando mais detalhes ao romance malfadado. Explorou também todo o aparato cinematográfico à sua disposição; a iluminação, por exemplo, se aproxima do visual grave de suas adaptações posteriores de Dickens, tornando o mais simbólica possível a estação escura e esfumaçada. Os efeitos sonoros também são bem utilizados (especialmente o de um trem acelerando), assim como a música, que incorpora o "Concerto para piano nº 2" de Rachmaninoff como tema do filme. No entanto, o mais importante é a utilização por parte de Lean de closes frequentes nos olhos de Johnson, que contam melhor uma história do que muitos roteiros. Ela e Howard estão excepcionais nesta que é a mais triste das histórias, cada movimento dos dois prenhe de significado e os diálogos impecáveis repletos de emoções profundas. Um olhar furtivo, um dedo acariciando a mão do outro e um riso compartilhado são praticamente tudo que é permitido a esses amantes desventurados, e Johnson e Howard transmitem belamente essa triste certeza. JKl
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 183)

182 1946 OS MELHORES ANOS DE NOSSAS VIDAS (THE BEST YEARS OF OUR LIVES, EUA)


Direção: William Wyler
Produção: Samuel Goldwyn
Roteiro: Robert E. Sherwood, baseado no livro Glory for Me, de MacKinlay Kantor
Fotografia: Gregg Toland
Música: Hugo Friedhofer
Elenco:
Myrna Loy ……………Milly Stephenson
Fredric March ………..Al Stephenson
Dana Andrews ………Fred Derry
Teresa Wright ………..Peggy Stephenson
Virginia Mayo ………...Marie Derry
Hoagy Carmichael …..Butch Engle

Ainda: Cathy O'Donnell. Harold Russell, Gladys George, Roman Bohnen. Ray Collins, Minna Gombell, Walter Baldwin, Steve Cochran, Dorothy Adams

Oscar: Harold Russell (prêmio honorário), Samuel Goldwyn (melhor filme), William Wyler (diretor). Robert E. Sherwood (roteiro), Fredric March  (ator), Harold Russell (ator coadjuvante), Daniel Mandell (edição), Hugo Friedhofe! (música)

Indicação ao Oscar: Gordon Sawyer (som)

Hoje em dia este épico doméstico sobre três veteranos da Segunda Guerra Mundial retornando para a vida civil, de 172 minutos de duração e premiado nove vezes com o Oscar, é considerado datado. Críticos mordazes como Manny Farber e Robert Warshow foram bastante desdenhosos em relação a ele quando de seu lançamento – embora aparentemente por opiniões políticas opostas. Farber o viu como uma bobagem liberal valendo-se de uma abordagem conservadora, enquanto Warshow o avacalhou através de uma perspectiva mais marxista. Seu diretor, William Wyler, e sua fonte literária, o romance de MacKinlay Kantor, não estão nem um pouco em moda atualmente. O veterano no elenco, Harold Russell, que perdeu as mãos na guerra, foi alvo de reflexões indignadas de Warshow sobre masculinidade tolhida e até mesmo de piadas infames do humorista Terry Southern muitos anos depois. Por tudo isso, eu o chamaria de o melhor filme americano sobre o retorno de soldados para casa que já vi - o mais tocante e o que cala mais fundo. Ele serve de testemunha de seu tempo e dos seus contemporâneos como poucos outros longas de Hoolywood, e a fotografia de Gregg Toland, que explora bem a profundidade de campo, é um de seus melhores trabalhos. Parte do que é tão incomum sobre Os melhores anos de nossas vidas enquanto filme hollywoodiano é o seu senso de distinção de classe - a maneira como os destinos e carreiras de veteranos bem de vida (Match), de classe média (Russell) e proletários (Andrews) são sobrepostos. Confessadamente, o fato de todos se encontrarem em um bar cujo dono é Hoagy Carmichael tem algo de ardil sentimental, porém o relativo apagamento das fronteiras de classe no serviço militar que é brevemente transferido para a vida civil também tem seu lado plausível. As limitações de Russell como ator também foram usadas como argumento contra o filme, no entanto o fato de o aceitarmos como o veterano de guerra deficiente que ele era soa como uma verdade muito mais importante e documental que, nesse caso, suplanta os interesses da ficção. As cenas entre ele e sua noiva (fictícia) são arrebatadoras tanto por sua ternura quanto por sua honestidade. Poucas passagens no cinema americano se igualam a elas. JRos
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sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

181 1945 SEI ONDE FICA O PARAÍSO (I KNOW WHERE l'M GOING, INGLATERRA)


Direção: Michael Powell, Emeric Pressburger
Produção: George R. Busby, Michael Powell, Emeric Pressburger
Roteiro: Michael Powell, Emeric Pressburger
Fotografia: Erwln Hilller
Música: Allan Gray
Elenco:
Wendy Hiller ………Joan Webster
Roger Livesey …….Torquil MacNeil
Pamela Brown …….Catriona
Finlay Currie ………Ruairidh Mhór
George Carney ……Sr. Webster
Nancy Price ……….Sra. Crozier
Ainda: Walter Macludd, Captain Duncan MacKenzie, Adan Sidler, Finlay Currie, Murdo Morrinson, Margot Fitzsimmons,  Captain C. W. R. Knight, Donald Strachan, John Rae, Duncan Macintire,  Jean Cadell

Sei onde fica o paraíso se destaca como uma das mais perfeitas da série de obras-primas delirantes realizadas pela dupla Mlchael Powell e Emeric Pressburger na década de 40. Joan Webster (Wendy Hiller), muito sexy com seus terninhos, é uma jovem inglesa prática, típica do pós-guerra, que viaja para as ilhas Hébridas para se casar com um milionário velho o bastante para ser seu pai. No entanto, sua obstinada caça ao ouro é atrapalhada por um bando de escoceses estranhos que trama para que ela caia nos braços de seu amor predestinado: Torquil MacNeil (Roger Livesey), um herói de guerra local sem um tostão. Além de serem os únicos cineastas capazes de chamar impunemente um herói romântico de "Torquil", Powell e Pressburger vão contra a visão cínica de ilhéus escoceses conspiradores e beberrões de Alegrias a granel (1949), dos estúdios Ealing, apresentando um grupo tão trapaceiro quanto, mas que trabalha por uma boa causa. A inflexibilidade urbana de Joan é logo desarmada por um monte de lendas celtas envolvendo o redemoinho da região, que representa os deuses e permite um empolgante clímax de resgate no mar. Em um elenco de apoio enorme, Pamela Brown está especialmente memorável como Catriona Pottis, uma nativa sinistramente encantadora. KN
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 181)

180 1945 CURVA DO DESTINO (DETOUR, EUA)



Direção: Edgar G. Ulmer
Produção: Leon Fromkess, Martin Mooney
Roteiro: Martin Goldsmith, baseado no livro de sua autoria.
Fotografia: Benjamin H. Kline
Música: Leo Erdody, Clarence Gaskill, Jimmy McHugh
Elenco:
Tom Neal …………………Al Roberts
Ann Savage ………………Vera
Claudia Drake ……………Sue Harvey
Edmund MacDonald ……Charles Haskell Jr
Tim Ryan ……Proprietário de restaurante 
Esther Howard ……………Holly
Ainda: Pat Gleason

"O destino ou alguma outra força misteriosa pode mexer comigo ou com você sem nenhum motivo especial." Um dos maiores filmes B já produzidos, Curva do destino não tenta ir além dos seus orçamento e cronograma de filmagem apertados. Em vez disso, se aproveita da sua própria simplicidade, apresentando um mundo em algum lugar entre a ficção pulp e o existencialismo, no qual a vida tem valores de produção baixos e duração curta. Um músico de jazz maltrapilho (Tom Neal) que viaja de carona pelos Estados Unidos vê sua vida se transformar em um inferno quando um motorista cai morto, Incriminando-o. Ele se envolve com uma mulher vulgar (Ann Savage) que o leva à degradação e ao assassinato, culminando em uma briga inesquecível em um quarto de hotel barato na qual Savage acaba com um fio de telefone enrolado em volta do pescoço. Edgar G. Ulmer, um expressionista alemão suando a camisa em produções baratas, era um cineasta mais pretensioso do que seus admiradores gostariam de admitir, porém esta é uma das verdadeiras obras-primas da época em que ele passou nas trincheiras da classe Z. Os astros desconhecidos (Neal, um fracassado na vida real, mais tarde cumpriu pena por assassinato) são resolutamente desprovidos de glamour e os cenários de estúdio, beiras de estrada anônimas e paisagens retroprojetadas evocam um mundo saindo do controle - no qual os desdobramentos impulsionados por coincidências de um roteiro mal amarrado de filme B podem sugerir a influência maligna de um destino impiedoso. KN


179 1945 FARRAPO HUMANO (THE LOST WEEKEND, EUA)


Direção: Billy Wilder
Produção: Charles Brackett
Roteiro: Charles Brackett, Billy Wilder, baseado no livro de Charles R. Jackson
Fotografia: John F. Seitz
Música: Miklós Rózsa
Elenco:
Ray Milland …….....Don Birnam
Jane Wyman ……..Helen St. James
Phillip Terry ……….Nick Bernam
Howard Da Silva …Nat
Doris Dowling …… Gloria
Ainda: Frank Faylen, Mary Young, Anita Sharp-Bolster, Lillian Fontaine, Frank Orth, Lewis L. Russell, Clarence Muse

Oscar: Charles Brackett (melhor filme), Billly Wilder (diretor), Charles Charles Brackett, Billy Wilder (roteiro), Ray Milland (ator)

Indicação ao Oscar: John F. Seltz (fotografla), Doane Harrison (edição), Miklóns Rózsa (música)

Festival de Cannes: Billy Wilder (palma de Ouro), Ray Milland (ator)

Antes de Farrapo humano, bêbados em Hollywood eram em sua maioria figuras cômicas; na verdade, caricatas: bufões adoráveis cambaleando, fazendo piadas com a voz arrastada e passando cantadas em garotas bonitas. Billy Wilder e Charles Brackett seu co-roteirista habitual, ousaram fazer algo diferente, criando a primeira abordagemadulta, inteligente e impiedosa do cinema americano da terrível degradação do alcoolismo. Mesmo hoje em dia, algumas cenas são quase dolorosas demais de assistir. Ray Milland, em um papel que definiu sua carreira e lhe rendeu seu primeiro Oscar, interpreta Don Birnam, um escritor nova-iorquino lutando contra seu vício e finalmente sucumbindo a ele no espaço de um longo e calorento fim de semana de verão na cidade. Assim como fizera com Fred MacMurray em Pacto de sangue (1944), Wilder deslinda e explora avidamente a insegurança por trás da persona cinematográfica afável de Milland. Em vez de deixar que nos distanciemos e julguemos Birnam com uma compaixão imparcial, Wilder nos empurra junto com ele para o abismo. Somos obrigados a acompanhá-lo à medida que ele abdica de todos os seus escrúpulos, mostrando-se disposto a mentir, trair e roubar para arranjar dinheiro para beber, até que, de forma terrivelmente inevitável, acaba no Inferno de uma ala de alcoólatras de um hospital público gritando de horror diante das alucinações do delirium tremens. Algumas partes do filme foram rodadas em locações em Manhattan, e Wilder aproveita ao máximo as ruas secas e banhadas de sol, filmadas por seu diretor de fotografia John F. Seltz para parecerem áridas e vulgares, como se estivessem sendo vistas através do olhar turvo e autodepreciativo de Birnam. Em uma sequência inesquecível, o escritor, que se rebaixa a ponto de tentar penhorar sua máquina de escrever para conseguir dinheiro para bebida, atravessa toda a poeirenta 3rd Avenue arrastando a máquina pesada - apenas para descobrir que é Yom Kippur e todas as lojas de penhores estão fechadas. Mais angustiante ainda é a cena em uma boate em que Birman sucumbe à tentação e tenta roubar dinheiro da bolsa de uma mulher - apenas para ser pego e humilhantemente jogado para fora enquanto o pianista lidera a clientela em um coro que canta "Somebody Stole Her Purse" ("Alguém roubou a bolsa dela") à melodia de "Somebody Stole My Gal". A trilha de Miklós Rózsa faz uso magistral do teremim, o antigo instrumento eletrônico cuja sonoridade sinistra e oscilante evoca perfeitamente a visão de mundo embriagada e fora de controle de Birnam. A censura do Código de Produção impôs um final feliz, embora Wilder e Brackett tenham conseguido evitar algo muito absurdamente animador. Mesmo assim, a Paramount estava convicta de que o filme seria um fracasso, com a alarmada Indústria de bebidas oferecendo ao estúdio 5 milhões de dólares para que ele fosse enterrado de vez. Os adeptos da Lei Seca, por outro lado, estavam em polvorosa, afirmando que ele encorajaria o hábito de beber. Apesar de tudo. Farrapo humano foi um grande sucesso de crítica e de público. "Foi depois dele", afirmou Wilder, "que as pessoas começaram a me levar a sério." Nenhum outro filme posterior sobre o alcoolismo, ou sobre qualquer outra forma de vício, conseguiu evitar uma mesura a Farrapo humano. PK
(1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER 179)