Direção: Jim
Sharman
Roteiro: Jim
Sharman, Richard O’Brien
Produção: Michael White, John
Goldstone (Produtor Associado), Lou Adler (Produtor Executivo
Elenco: Tim
Curry, Susan Sarandon, Barry Bostwick, Richard O’Brien, Patricia Quinn, Nell
Campbell, Charles Gray
The Rocky Horror Picture Show é sinônimo de cinema cult.
Endeusado por gerações e mais gerações de jovens a trintões e quarentões, o
musical / comédia / horror do diretor Jim Sharman é um clássico absoluto tanto
para quem é fã do gênero, como para quem não é. Lançado em 1975, dois anos após
a peça musical estrear nos teatros ingleses, é um caso curioso de filme feito
por um grande estúdio, aqui no caso a 20th Century Fox, que acabou se
popularizando nas sessões da meia-noite e seus “double features” como a própria
emblemática música de abertura evoca, recheado de toneladas e mais toneladas de
referências de clássicos da
ficção-científica e filmes de terror dos anos 30 até 50. Fora toda a
estética glam rock, estilo musical dos anos 60 e 70, que tem David
Bowie como um dos grandes ícones, caracterizado por músicos andróginos,
maquiagem, purpurina e roupas coladas. Todos esses elementos entraram em
ebulição quando transportados ao cinema pelo produtor executivo Lou Adler. Um
banho de sexualidade e transexualidade aterrissou nas telas naquela metade dos
anos 70, e por mais que tenha sido um fracasso retumbante de bilheteria no
circuito convencional, ganhou sua aura cult no decorrer dos anos e ainda hoje é
objeto de estudo e admiração dos jovens, sendo citado em filmes adolescente
indies como As Vantagens de Ser Invisível ou na baboseira chiclete
televisiva Glee, fazendo com que seu público se renove sempre com o passar dos
anos. TRHPS é um fenômeno social cinematográfico. Sua cenografia
(simplista, tal qual a peça de teatro), as atuações exageradas (feitas por toda
a trupe inglesa da peça, com exceção do casal protagonista americano Brad
Majors, vivido por Barry Bostwick e Janet Weiss, vivida por Susan Sarandon), as
mensagens (subliminares e escancaradas), as canções e suas coreografias e a
trama que parodia o clichê do clichê do clichê do cinema de matinê e de
drive-in se mostraram uma aposta certeira. Não há como um único fã de terror (aqueles
malucos como eu que escrevo e você que lê esse blog), não querer passar a
película inteira decifrando todas as referências a esse universo fantástico,
seja nas letras, nos arquétipos dos personagens, na trama e subtramas paralelas
ou nas memorabílias espalhadas pelos 100 minutos de projeção. Começa pelo casal
em lua de mel em perigo, que durante uma noite de tempestade, vai parar no
lugar errado e na hora errada (claramente inspirado no casal Peter e Joan
Alison de O
Gato Preto, filme de
1934 da Universal, uma das pérolas produzidas por Carl Laemmle Jr. durante a
Era de Ouro do estúdio). Acontece que ali é a residência do transex e completamente
despirocado Dr. Frank-N-Furter, impecavelmente vivido por Tim Curry em seu
papel mais emblemático (junto com o palhaço Pennywise de It – Uma Obra
Prima do Medo), o cientista louco da vez com seus ajudantes, o corcunda
Riff-Raff (Richard O’Brien), e as estranhas beldades Magenta (Patricia Quinn –
que em determinado momento irá se caracterizar na personagem de Elsa Lanchester
em A Noiva de Frankenstein) e Columbia, a groupie (Nell Campbell). Isso sem contar
a narração pontual do Criminologista e expert interpretado por Charles Gray (ator que é impossível
dissociar de seu papel de Mocata em As Bodas de Satã da
Hammer). O famigerado doutor, entre um e outro ato de canto e dança, finalmente
dá vida a sua criação, Rocky Horror, vivido pelo musculoso Peter Hinwood, tal
qual o Dr. Frankenstein. Todo esse caldo é pano de fundo para a lascívia de
Frank-N-Furter, as descobertas sexuais (e puladas de cerca) dos heróis e uma
ode à cafonalha setentista, ao visual camp e elementos queers, que
obviamente afugentaram o americano médio das salas de cinema, mas que ganhou
sua força exatamente por seu aspecto B escancarado, quando voltado ao
público underground, marginalizado, reprimido sexualmente (aí vale para
héteros, por meio do casal que esconde sua libido por simples imposição social
daqueles tempos e para os gays, que não preciso nem discursar aqui) que se
identificava com a produção, e o via como uma forma de expressão, de
questionamento, tomar posição e de fazer se “levantar a voz” em tempos de
homofobia, intolerância e valores morais exacerbados gritantes. Frank-N-Furter
aparece como um libertino libertário, como um doce travesti (como na letra da
música cantada por Curry) em seu escandaloso corselet, salto alto, cinta-liga,
cantando aos quatro ventos sobre quem ele é, o que ele quer fazer e criar,
exatamente para chocar a plateia e seu rival, o cientista Dr. Everett V. Scott
(Jonathan Adams) que funciona como o contraponto que representa os pensamentos
reacionários da sociedade, e servir com um mártir, um messias que execra
os dont’s e é um estopim para os do’s de uma sociedade
inteira e todos os seus tipos. Abre mundos como de Brad e sua homossexualidade
latente, Janet e sua libido guardada a sete chaves pelo papel de esposa
subserviente. Esqueça sua opção sexual, seu fetiche, seu credo, cor e raça,
estilo musical que ouve, tipo de roupa com que se veste, ser excluído, minoria,
sofredor de bullying. A mensagem gritante para esses oprimidos é:
encontre o seu Frank-N-Furter dentro de você, lhe dê voz e a capacidade de
criar, e saia do armário (armário que vale não apenas no sentido de escolha
sexual, mas um armário que funciona como uma reprimenda de seus medos no fundo
de sua psique). A emblemática cena de abertura com a música tema “Science
Fiction Double Feature” e suas diversas referências originalmente mostraria os
créditos dos atores entre clipes dos filmes citados. A ideia foi abortada por
Brian Thomson, designer de produção, pois seria impossível ir atrás da
permissão de todos os estúdios para que esse material fosse exibido e lhe
ocorreu a ideia dos lábios, inspirado pela pintura de Man Ray “A l’heure de
l’observatoire, les Amourex”. E bingo! Uma daquelas ideias tão acertadas que
aquela boca vermelha carnuda se tornou uma marca registrada deTRHPS. Fora essa
abertura e todos os pequenos easter eggs, o filme ainda tem uma cacetada
de símbolos dos clássicos estúdios de cinema, como um dos mais emblemáticos, a
torre de rádio e raio da RKO Radio Pictures, o globo símbolo da Universal e o
grande Atlas, símbolo da Amicus, entre tantos outros. É como eu disse: assistir
a TRHPS é um caça-palavras cinematográficos que entretém os fãs mais
fervorosos. No interessante campo dos quase, Mick Jagger queria o papel de
Frank-N-Furter que acertadamente ficou para Tim Curry, oriundo da peça
original; Steve Martin foi cotado para o papel de Brad Majors; e Vincent Price
para o papel do Criminologista, que não pode aceitar por conflitos de agenda. Mas
o mais importante de tudo em The Rocky Horror Picture Show é que
através de seus personagens facilmente identificáveis, mesmo que caricatos, é a
capacidade de mostrar ao público a redenção, a descoberta do seu eu, de seus
desejos, e por fim, se ver aceito no mundo. Até por isso ele tem tanta força
nos adolescentes e continua perdurando até hoje em dia, funcionando com um belo
serviço psicológico e social e, além disso, também despertando certo interesse
nos clássicos, que hoje parecem anos luz de distância dessa geração vídeo-clipe
e vídeo-game. É um sinônimo de ousadia em todos os sentidos.
FONTE:
http://101horrormovies.com/2013/12/10/324-the-rocky-horror-picture-show-1975/
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