Direção: Peter Sykes
Roteiro: Chris Wicking, John
Peacock (baseado na obra de Dennis Wheatley)
Produção: Roy
Skeggs
Elenco: Richard
Windmark, Christopher Lee, Honor Blackman, Denholm Elliott, Michael Goodlife,
Nastassja Kinski
Uma Filha
para o Diabo é o canto do cisne da Hammer, antes de fechar as
portas. O prego no caixão daquele que foi o mais importante estúdio de terror
durante o final das décadas de 50 e 60, reinventando os monstros da Universal e
trazendo sangue, sexualidade e cores para o gênero, e que desde o começo dos
anos 70, vinha mostrando perda de força e principalmente de público, em grande
parte por se ater a uma narrativa gótica com seus vampiros e criaturas
sobrenaturais, que a audiência não queria mais ver nos cinemas. Tanto que Uma
Filha para o Diabo é uma tardia tentativa da Hammer de se equiparar ao
crescente anseio dos fãs de terror pelo satanismo, muito impulsionado
primeiramente por O Bebê de
Rosemary, de Roman Polanski, de 1968, e depois pelo sucesso
estrondoso de O Exorcista, de William
Friedkin, lançado no ano anterior. Reflexo do final da Era de Aquarius e aquele
sentimento desgostoso na boca dos americanos com o fim da geração “paz e amor”
e o crescimento do pessimismo pós-guerra do Vietnã, que tentou ser aproveitado
pelo estúdio assim como outras modinhas de época, que deram miseravelmente
errados (como os filmes de kung-fu no inenarrável A Lenda dos Sete Vampiros, ou de espionagem em Ritos Satânicos de Drácula). Porém, como tudo que envolvia A
Casa do Horror em seus últimos anos, o filme foi cercado de problemas,
insatisfação de atores, escolhas de casting de
última hora e até revolta do escritor Dennis Wheatley, que escreveu o livro em
que o filme se baseia. Após ver o resultado final, o sujeito simplesmente
proibiu que qualquer outro livro dele fosse levado às telas pela Hammer, por
considerar o filme obsceno e muito longe de sua fonte literária. E olha que
quase dez anos antes, a Hammer lançaria talvez seu melhor filme, As Bodas de
Satã, também baseado em um livro do autor. Entre a penca de
problemas envoltos na produção, a Hammer e a EMI, co-produtora do filme,
tiveram percalços financeiros e atritos para conseguir chegar a um consenso e
selecionar tanto o responsável pela direção do longa, que ficou a cargo de
Peter Sykes e para o papel de John Verner (Richard Widmark). A contratação de
Windmark fez com que outros atores fossem dispensados, pois seu cachê era muito
alto para o orçamento que tinham em mãos, e com isso os atores Michael Goodlife
e Anthony Valentine foram escalados de última hora. Junte isso também a
polêmica envolvendo duas cenas de nudez, uma de Christopher Lee, feita pelo seu
habitual dublê de corpo, e outra o nu frontal da ninfeta Nastassja Kinski, que
tinha só 17 aninhos na época. Tudo corria para ser um desastre. O filme até que
tem uma temática interessante e se sustenta por grande parte dos seus 95
minutos, principalmente por conta da caralhada de heresias e blasfêmias
colocadas em cena, algo que a audiência clamava desde que Regan McNeil, sob
influência de Pazuzu, mandou o moralismo dos filmes de horror às favas, e a
magnânima atuação do sempre ótimo Christopher Lee como Michael Rayner, um padre
excomungado que resolve se tornar adorador de Astaroth, e de Natassja Kinski
como a freirinha Catherine Beddows, que apesar da bata, foi criada desde
pequena para ser uma serva do mal e transpira malícia e sensualidade. O que dá
muito errado é exatamente a nêmese do padre Michael, o escritor inglês de
livros sobre ocultismo, Verner, que não é um adversário a altura do eterno
Drácula, os efeitos especiais bisonhos (como o pequeno bebê demônio, que mais
provoca riso que espanto), o roteiro desconexo, as situações atabalhoadas,
principalmente do controle mental que o padre Michael tem sobre a jovem Catherine,
a direção frouxa de Sykes e o final abrupto e que deixa muito a dever. É um
filme ambíguo que tinha tudo para dar certo, e tenho certeza que se fosse
lançado na fase áurea da Hammer (vide o próprio As Bodas de Satã) seria um
filmaço. A trama é que o padre Michael ao abandonar a Igreja há vinte anos,
tornou-se um seguidor do chifrudo e começou uma nova ordem satânica no
interioria da Bavária, na Alemanha. Os Beddows fizeram um pacto e ofereceram
sua filha recém-nascida, Catherine, para que quando florescesse os seus 18
anos, na noite de Todos os Santos, seria usada como receptáculo para trazer o
Coisa-Ruim à terra e dominar o mundo. Porém, arrependido, o pai da moçoila,
Henry Beddows (Denholm Elliot) resolve voltar atrás e pede ajuda de Verney para
manter a menina em segurança e frustrar os planos do padre Michael, com a ajuda
de sua agente literária e seu amante. O embate entre dois entendedores das
artes ocultas se dará até seu final, mas em uma dinâmica que não chega nem aos
pés de Duc de Richeleau (Lee, bonzinho) contra o terrível satanista Mocata
(Charles Gray) em As Bodas de Satã. Você vê que não paro de
comparar as duas produções, tamanho o abismo entre elas. Uma curiosidade é que
aquele final tosco e do nada não é o final original de Uma Filha para o
Diabo.
ALERTA
DE SPOILER. Pule para o próximo parágrafo ou leia por sua conta e risco.
No roteiro original, o padre Rayner se
recupera da pedrada que leva (sim, o vilão do filme é detido com uma pedrada!)
e persegue Verner que acabara de salvar Catherine e levá-la carregada para fora
do local onde está para acontecer a missa negra. Ele então é atingido por um
relâmpago quando ele cruza o círculo de sangue protetor que fez no chão. Seria
“menos pior”. Vale a pena dar uma conferida em Uma Filha para o Diabo,
obviamente. A Hammer não atingiu sua redenção, e teve que encerrar suas
atividades, sendo revivida como o próprio Drácula só depois de quarenta anos.
Mas apesar da gema em mãos, que foi literalmente jogada fora por um conjunto de
fatores internos e externos, poderia ser muito pior. Imagine se o último filme
do estúdio tivesse sido o anterior e sofrível A Lenda dos Sete Vampiros?
Ainda bem que este aqui foi lançado pelo menos com certo esforço para tentar,
pela última vez, fazer dar certo.
FONTE: http://101horrormovies.com/2013/12/20/332-uma-filha-para-o-diabo-1976/
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