Direção: Brian De Palma
Roteiro: Lawrence D. Cohen (Baseado no
livro de Stephen King)
Produção: Paul Monash, Brian De Palma
(não creditado), Louis A. Stroller (Produtor Associado)
Elenco: Sissy
Spacek, Piper Laurie, Amy Irving, John Travolta
Carrie – A
Estranha é o primeiro sucesso comercial do diretor Brian De
Palma, que passou a década toda aperfeiçoando suas técnicas de filmagem
inspiradas em Alfred Hitchcock, e também a primeira de inúmeras adaptações às
telas de um livro de Stephen King. E me atrevo a dizer que mais de trinta anos
passados, ainda assim é a minha adaptação preferida de todas as suas obras para
o cinema, mesmo com suas diferenças em relação ao texto do escritor. Isso se
deve muito a três forças motrizes que elevam esse filme aos altos degraus do
Olimpo do cinema de horror: A primeira, claro é a direção de De Palma, que
trabalha muito bem os nuances do terror, o crescente suspense, o descontrole
emocional dos personagens, a descoberta da sexualidade, e o cotidiano com cenas
poéticas e de uma beleza ímpar, além da sua peculiar maneira de filmar com a
câmera acompanhando os personagens e sua tara por planos sequência.
Alerta
de SPOILER (se ainda
não assistiu ao filme, vá para o armário e reze, e pule para o próximo
parágrafo ou leia por sua conta e risco).
A antológica sequência do baile de formatura
traz diversos elementos e técnicas de narrativa que vão deixando o espectador
tenso até que o balde cheio de sangue de porco caia sobre a pobre garota
esquisita. Tudo começa com Carrie vencendo o concurso de rainha do baile, num
esquema preparado pelas rivais de escola como a mais perfeita tradução da
palavra bullying. É um momento mágico e sublime em câmera lenta. Em
seguida, uma tensão avassaladora vai tomando conta do espectador enquanto uma
de suas amigas descobre o terrível plano e tenta alertar a professora. E
depois, a sequência final parece um trem desgovernado, com Carrie dando vazão a
todo seu poder descomunal, enquanto De Palma utiliza de separações da tela em
dois planos diferentes para mostrar tanto a garota quanto os pobres coitados
presos naquele salão de baile, além de brincar com o jogo de cores, entre o
vermelho e o azul. Fora isso, De Palma pinça toda a sexualidade latente
sugerida por King em seu livro e decide extrapolar esse limite, logo no começo
do longa na fatídica cena do chuveiro, quase tão emblemática quanto o baile de
formatura em si, que funciona como o estopim de todo esse turbilhão de
sentimentos que vão desde vergonha à prazer que se inicia exatamente no banho
de Carrie. Pintado quase como um quadro de ninfas gregas, enquanto as garotas
colegiais desfilam com seus seios à mostra e pelos pubianos em meio ao vapor
saído dos chuveiros quentes, Carrie solitária, inocente pero no mucho,
acaricia delicadamente seu corpo nu molhado, suas coxas, seu sexo,
incrementando uma mensagem erótica subliminar, até que apavorada tem sua
primeira menstruação, e desesperada por não ter nenhum tipo de instrução
sexual, tenta pedir ajuda às colegas de colégio, que começam a jogar
absorventes nela e a tratar ofensivamente. Pronto, o palco está montado para o
final explosivo. A segunda é o texto de King. Antes de Carrie – A
Estranha, ele era apenas um professor de inglês medíocre que morava com sua
esposa em um trailer em Portland, no Maine, aspirando um dia tornar-se um
escritor famoso. Largamente influenciado em sua vida por Edgar Allan Poe e H.P.
Lovecraft e pelos quadrinhos de terror da EC Comics, King havia escrito um
romance sobre uma garota que vive em uma cidadezinha ordinária nos Estados
Unidos, é feita de gato e sapato na escola, com necessidade de ser aceita como
todas as garotas adolescentes e a dificuldade dessa inserção social, pena nas
mãos de uma mãe cristã fundamentalista radical, tudo isso além do fato dela
possuir poderes telecinéticos. Ele havia detestado o resultado do livro e jogou
o manuscrito na lixeira, resgatado por sua esposa, que achou incrível e o
encorajou a terminar o romance. O resto é história. Por fim, a terceira é a
atuação de Sissy Spacek como Carrie e Piper Laurie como sua mãe afetada, ambas
indicadas ao Oscar como melhor atriz e melhor atriz coadjuvante
respectivamente. Spacek está fantástica no papel título, melhor atuação de toda
a sua carreira sem dúvida. Seus olhares, a forma como seu rosto e seu corpo se
contorcem e reagem na cena do baile de formatura, são um espetáculo a parte. E
daqui até o final, ela vai passar praticamente todo filme completamente
ensanguentada. Laurie como a Sra. White e todo seu alucinado fervor religioso,
onde tudo é pecado e penitência, também dá um show de atuação, principalmente
na sequência final (Alerta de SPOILER de novo) quando
revela como Carrie nasceu, ao ceder às tentações e ter feito sexo (e gostado!)
com o pai bêbado da garota, e ao ser esfaqueada na posição da cruz, nitidamente
sente uma espécie de prazer reprimido em toda aquela dor. Fora que ela fica
igualzinha uma figura bizarra de Jesus Cristo alojado no armário onde Carrie
roga por seus pecados. É tipo um Jesus de cabelão crespo, sem barba, mais
parecendo um cantor de rock de arena dos anos 60, com várias flechadas no peito
e os olhos esbugalhados e brilhantes. Vai entender… Carrie – A Estranha é
cercado de subtextos para quem quiser enxergá-los além do horror. Fala sobre o
preconceito às diferenças, sobre o desejo de vingança que nasce, cresce e
corrói dentro de todos aqueles excluídos socialmente (principalmente em um
ambiente opressor como o colégio), fala sobre os absurdos do fundamentalismo
religioso que é capaz de gerar monstros em nome da fé e principalmente,
fala do poder feminino, da repressão, da misoginia, do estigma da sexualidade
da mulher ter de ser escondida e combatida por movimentos religiosos e
retrógradas convenções sociais, e que o poder sobrenatural (que pode ser
substituído por prazer, personalidade, desejos, liberdade, vontades, o que que
quer você escolha) tem de ser escondido dentro de um armário escuro, e que
vindo à tona, vem recoberto de fúria, de sangue e fogo. E todos aqueles que
contribuíram para que essa situação chegasse ao limite, família, colegas de
escola, sociedade (afinal no livro Carrie simplesmente destrói a CIDADE
INTEIRA, não apenas o baile como no filme com seu orçamento apertado) devem e
serão punidos. O remake de Carrie – A Estranha chegou
aos cinemas em 2013. Isso depois de uma sequência tosca e um filme água com
açúcar chato, mambembe e interminável feito diretamente para a TV. Infelizmente
o clássico de Brian De Palma e Stephen King e transformou em um terrorzinho
desnecessário para essa geração de adolescentes que estão acostumados com A
Saga Crepúsculo, Jogos Vorazes e afins.
FONTE: http://101horrormovies.com/2013/12/14/328-carrie-a-estranha-1976/
1001 FILMES PARA VER ANTES DE MORRER
607 1976
CARRIE, AESTRANHA (Carrie)
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