Direção: David
Cronenberg
Roteiro: Davis
Cronenberg
Produção: Claude
Heroux, Pierre David e Victor Solnicki (Produtores Executivos)
Elenco: Oliver Reed, Samantha Eggar, Art Hindle, Henry Beckman,
Nuala Fitzgerald, Cindy Hinds, Susan Hogan
Cronenberg é
Cronenberg. Ponto. Seu começo de carreira foi completamente visceral,
experimental, escancarando seu apreço pela carne, pelos distúrbios sociais,
psicológicos, médicos e científicos. Apesar de Os Filhos do Medo ser considerada
uma obra menor (e bem pessoal até certo ponto), é Cronenberg sendo o cineasta
do mal que costumava ser lá pros anos 70 e 80 (hoje faz filme com o Robert
Pattinson, mas enfim). E sim, Os Filhos do Medo é um filme do mal.
Apesar do roteiro pouco inspirado, do próprio canadense, que arrasta uma trama
comportamental entre pai, filha, mãe louca e um psiquiatra não convencional
(considerando sua versão para Kramer vs Kramer – ganhador absoluto do
Oscar daquele ano), que detalhe, foi escrito durante a turbulenta
separação do diretor com sua esposa Margareth Hindson, e briga pela custódia de
sua filha, quando chega aos dez minutos finais, meu amigo (ou minha amiga),
sente que lá vem um soco no estômago daqueles bem dados, que só a mente doentia
de Cronenberg seria capaz de vislumbrar. Mas ainda chegarei lá. Adepto das mais
bizarras e escabrosas teorias científicas e médicas, Cronenberg que já havia
trabalhado (e muito bem) esse expediente nos anteriores (e ótimos) Calafrios e Enraivecida na Fúria
do Sexo,
diferente do apreço pelo exploitation nestes outros longas, aqui pela
primeira vez tenta criar uma espécie de drama existencial muito mais perene do
que um complexo predial infestado por parasitas ou uma ninfomaníaca que espalha
um poderoso surto de raiva, e mais ainda, extrapola o limite carnal e explora
também os meandros psicológicos e os perigos que a sugestão e somatização podem
causar nos seres humanos, inclusive fisicamente. Para tal, somos apresentados
ao Dr. Hal Raglan, vivdio pelo excelente Oliver Reed com sua voz lenta e quase
sussurrada. Ele é dono do instituto Somafree, criador da controversa técnica
chamada “psicoplasma” e autor do livro “The Shapes of Rage”. O objetivo desta
técnica é fazer com que seus pacientes manifestem sua raiva e todos seus
sentimentos reprimidos em seu estado mais puro, geralmente através de jogos
mentais onde interpreta papeis de outras pessoas com quem tem relações
problemáticas. Como efeito colateral, surgem em suas peles manchas vermelhas e
escoriações, como uma espécie de somatização da raiva. Em alguns casos mais
graves, alguns pacientes desenvolvem grotescos tumores e cancros de pele. Pois
bem, o empreiteiro Frank Carverth (interpretado por um nada convincente e
carismático Art Hindle) é pai da pequena Candice (Cindy Hinds, uma espécie de
clone de Heather O’Rourke, a Carol Anne de Poltergeist – O Fenômeno) e casado
com Nola (a brilhante Samantha Eggar), que por sua vez está internada no
Somafree e é uma das pacientes fetiches do Dr. Raglan. Certa tarde ao voltar do
local após uma visita à mãe, a garotinha apresenta alguns ferimentos e
escoriações nas costas, e Frank fica convencido de que a menina foi agredida
pela progenitora. Disso, irá se desenvolver o restante da história com Frank
tentando desmascarar os métodos do Dr. Raglan e proteger a filha das loucuras
da mãe. Até aí parece um daqueles dramalhões do Supercine, certo? É então que o
geniozinho malvado de Cronenberg coloca uma criança assassina deformada na
história, assassinando primeiro a avó de Candice e mãe de Lola, Juliana (Nuala
Fitzgerald) espancando-a até a morte com um martelo de bater carne e depois o
avô e pai, e ex-marido de Juliana, Barton (Henry Beckman) com violentíssimos
golpes com uma esfera na cabeça. Após um rápido embate com Frank, a criaturinha
asquerosa misteriosamente morre, e ao ser examinada pelos médicos e pela
polícia, descobre-se que a criança (fisicamente parecida com Candice, mesmo
estatura e até se veste da mesma forma) tem uma aparência envelhecida, lábios
leporinos, ausência de órgãos genitais e principalmente, não possui umbigo, o
que significa que não foi concebida por meios naturais. Quando aqueles monstrinhos
atacam a professora de Candice matando-a cruelmente na sala de aula repleta de
criancinhas assustadas como testemunhas (YEAAAAH!), e sequestram a filha dos
Carveth, que Cronenberg finaliza o arco de sua história para que todos os
personagens principais se encontrem em uma conclusão acachapante.
ALERTA DE SPOILER. Pule para o próximo parágrafo ou leia
por sua conta e risco.
Nestes momentos
finais do filme que descobrimos que todos aqueles “filhos do medo” são prole de
Nola, que através da manifestação absoluta de sua raiva, por conta de abusos e
comportamento relapso dos pais que sofreu quando criança, desenvolve um nojento
útero externo, pelo qual dá vida àquela personificação de sua fúria em forma
daqueles seres grotescos. Inclusive somos testemunhas oculares de um dos fetos
nascendo, e Nola, tomada por um instinto maternal animal, retira-o da placenta
e começa a lambê-lo em uma cena abominável em que seu estômago provavelmente
vai dar um giro de 360º. Isso já vale todo o tempo arrastado que você parece
ter perdido vendo o resto dos 80 minutos de filme (salvo os ataques das
crianças hediondas). Os Filhos do Medo é marcado por uma cena emblemática.
Que é costumeiro no trabalho de Cronenberg colocar um determinado momento
cinematográfico ímpar em nosso imaginário para sempre (vide a cena da sauna
em Senhores do Crime, a cabeça explodindo em Scanners – Sua Mente
Pode Destruir, a ligação carnal com uma televisão em Videodrome – A Síndrome do
Vídeo ou o regurgitar de A Mosca). É uma imagem que vale mais por mil
palavras, como diz o velho ditado, mas uma imagem que realmente vale a pena de
ser vista, e até porque o próprio Cronnenberg coloca-o como um de seus filmes
mais clássicos, junto com o já citado A Mosca e Gêmeos – Mórbida
Semelhança.
FONTE: http://101horrormovies.com/2014/03/19/393-os-filhos-do-medo-1979/
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