domingo, 27 de março de 2016

#539 1987 O PORTÃO (The Gate, Canadá, EUA)


Direção: Tibor Takács
Roteiro: Michael Nankin
Produção: John Kemeny; Andras Hamori (Coprodutor)
Elenco: Stephen Dorff, Christa Denton, Louis Tripp, Kelly Rowan, Jennifer Irwin, Deborah Grover, Scot Denton

O Portão é um filme que me gera sentimentos ambíguos. Eu me lembro de três momentos distintos e três análises sobre a fita durante minha vida, cada uma das três chegando a uma conclusão diferente. Quando eu o vi criança, quando nos meus vinte e poucos anos e agora para escrever sua resenha para o blog. E a conclusão que cheguei é que O Portal é um filme de terror infantil, quase como uma fábula macabra. Ao vê-lo quando criança tinha lembranças de que era um filme verdadeiramente assustador. Quase não lembrava nada do desenrolar da trama, mas gravara na memória que a atmosfera havia me deixado incomodado, com toda aquela história de um buraco se abrindo no quintal e sendo um portal do inferno, trazendo criaturas demoníacas para nossa realidade através de uma espécie de ritual envolvendo antigas inscrições e um disco de heavy metal. Somente depois de muitos anos eu pude assisti-lo novamente. O Portão foi um desses filmes que insisti para alugarmos por ter exatamente essa lembrança de ser bem assustador, e fiz um enorme alarde sobre a fita. Foi uma decepção sem tamanho vê-lo novamente. Tudo caminhava exatamente como eu me lembrava, até o portal se abrir e aparecer aqueles malditos asseclas demônio em stop-motion e a fita escambar para o tosco, para o ridículo, e juro que não me recordava de ser um filme desse tipo. Frustração estabelecida, passei a detestá-lo, nunca mais assistindo novamente. Até que fatidicamente cheguei a sua vez na minha lista esquizofrênica e pensei: “bom, lá vou eu assistir novamente essa porcaria”. Eis então que agora com 32 anos nas costas, a minha visão do filme mudou drasticamente (de novo). Continua sendo um filme tosco e aqueles demônios cinza diminutos que parecem ter saído de algum filme B do Ray Harryhausen são ridículos, mas a visão por trás do contexto da história (e a expectativa gritante deixada de lado) criou certa mudança de perspectiva em meu julgamento. O Portão é um filme de terror infantil e é dessa forma que você tem que encará-lo. O próprio roteirista Michael Nankin baseou o roteiro em diversas experiências de sua infância e por isso o filme assusta tanto quando se é um jovem infante. São medos particularmente infantis, explora a dor da perda, de ter uma irmã mais velha adolescente, estar sozinho em casa por seus pais terem ido viajar e a eterna impressão de que algo sinistro ou macabro pode acontecer, misturado com um buraco aberto em seu quintal que com certeza vai ser o portão para alguma dimensão maligna (óbvio que você irá pensar isso!). Glen (vivido por um Stephen Dorff moleque em seu debute no cinema) é um garoto gordinho que gosta de lançamentos de foguetes de brinquedo e seu melhor amigo inseparável é um pequeno poser-metaleiro-farofa chamado Terry (Louis Tripp) que perdera a mãe há pouco tempo e mora com o pai que lhe dá discos de metaaaaaaaal de presente. Os pais de Glen viajam um final de semana e deixam a casa aos cuidados da irmã mais velha adolescente, Alexandra (Christa Denton). Mas durante a noite anterior um raio cai na árvore que fica no quintal, abrindo um buraco no chão. Ao investigar o buraco, Glen se espeta em uma farpa e deixa cair sangue no local, de onde saiu um geode. Mais tarde naquela noite em que Terry vai dormir na casa do amigo (o quão você se lembra da sua infância por conta disso?), eles abrem o geode que deixa uma bizarra inscrição. Na mesma noite, alguns acontecimentos sinistros se revelam como Terry ver a aparição de sua mãe morta e o velho cachorro de Glen, Angus, vir a falecer. No dia seguinte, Terry descobre no álbum de heavy metal da banda Sacrifice (que existiu de verdade no Canadá) letras supostamente baseadas em um tal “Livro das Trevas”. Ele acredita que o buraco é uma porta de entrada para antigos deuses malignos (olha a inspiração à lá Lovecraft aí). Com o sangue do virgem Glen e mais o sacrifício de um animal enterrado ali (um dos amigos de Alexandra não conseguiu nenhum local para enterrar Angus e acabou jogando-o no buraco), a conjuração está completa e nosso mundo será invadido por criaturas das trevas. É um PUTA roteiro, a atmosfera até esse momento é incrível e poderia render um filmaço, se não fossem aquelas entidades demoníacas tosquinhas que estragam todo o clima e o andar a carruagem. Ainda há espaço para a aparição de um zumbi, o ataque de um possuído Terry, portais dimensionais que se abrem pela casa, um olho que surge na palma da mão do garoto (em uma cena MUITO legal até hoje) e no final, uma criatura gigante também de stop-motion que não ajuda em nada a melhorar o longa. Uma pena! Detalhe que os criador dos efeitos visuais das criaturas, Randall William Cook ganharia três Oscar futuramente pelo FX da trilogia O Senhor dos Anéis. Mas, aí entramos de novo no preceito básico que por mais que você quisesse que os demônios ou os deuses antigos fossem diferentes, até com uma pegada mais Lovecraft ou uma coisa mais sinistra que aqueles tampinhas (que na verdade são atores reais vestidos em uma fantasia de borracha, filmados com uma perspectiva forçada para parecerem pequeninos) para dar outro clima ao filme, devemos no ater ao fato de O Portão ser simplesmente um conto de fadas às avessas. É um filme de terror para crianças como comentei lá em cima (duas vezes até). E nisso ele funciona perfeitamente bem. Afinal, quantos de vocês não adorou o filme ou tinha medo do mesmo quando novinhos? Não é um filme de terror para adolescente ou para adulto (exceto para ver com os filhos, talvez). E é isso, ponto. Eu não sou mais o público alvo, você aí do outro lado da telinha do computador também não é. Mas já foi quando criança. Nem sei se realmente essa era a verdadeira expectativa dos realizadores porque nunca li nada sobre, ou estou nas elucubrações a mil, mas é uma forma de encarar a fita ao invés de simplesmente julgá-la tosca gratuitamente (como muita porcaria produzida por Charles Band, por exemplo) como eu mesmo já o fiz. Deixe isso de lado, coloque o saudosismo à prova e aproveite a experiência já que o cinema é uma das poucas chances que você tem de voltar ao tempo e lembrar-se de outra vida que você teve antes de tudo tornar-se tão mais sério e realista.
FONTE: https://101horrormovies.com/2014/10/08/539-o-portao-1987/

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